A CPI do Cimi instalada na Assembleia
Legislativa do Mato Grosso do Sul em setembro de 2015 vai chegando ao seu
final. A CPI tinha por objeto demonstrar que a atuação do Cimi no estado era de
incentivar invasões de propriedades privadas e contribuir financeiramente com
essas chamadas “invasões”, que os povos indígenas caracterizam como retomadas,
ou retorno aos tekohá, territórios tradicionais. Para além desses objetivos
explícitos sabe-se da articulação de interesses políticos e econômicos para
inviabilizar o reconhecimento e demarcação das terras indígenas. Prova disso
foram as presenças de convidados que proferiram “palestras”, visando demonstrar
a atuação do Cimi, caracterizada como de ameaça à soberania nacional, dentro
dos ditames da Teologia da Libertação e da Igreja progressista.
Presidente e secretário executivo do Cimi repudiam e esclarecem
Durante horas a fio os membros da
Diretoria do Cimi esclareceram pormenorizadamente a atuação da entidade e
repudiaram as insinuações de que seus membros estariam envolvidos em ações de
instigação de invasões de fazendas. Tais acusações foram energicamente
rebatidas, consideradas um absurdo. A entidade se pauta rigorosamente pelos
princípios da Constituição Federal e o estatuto que rege as ações da
organização, vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB.
Quanto à acusação de que estariam sendo fornecidos recursos para os indígenas
para a prática de ilícitos, o secretário do Cimi esclareceu pormenorizadamente
as regras que segue no tocante aos recursos utilizados, provindos de diversas
fontes, especialmente da cooperação internacional, e de organismos da Igreja
Católica no Brasil. São realizadas auditorias independentes, regularmente, e
feitos relatórios financeiros e de atuação e gasto dos recursos conforme a
programação estabelecida nos projetos.
Presentes aliados e apoiadores nacionais e internacionais
Por ocasião do depoimento do secretário
Cleber Buzatto, estiveram presentes representantes de organizações da União
Europeia e de embaixadas de alguns países que apoiam os direitos dos povos
indígenas e seus aliados. O Cimi tem buscado, no decorrer de seus 44 de apoio
aos povos indígenas na conquista e garantia de seus direitos e suas vidas, a solidariedade
e o apoio internacional aos povos indígenas e ao trabalho da entidade. Esse é
um dos aspectos importantes, do compromisso do Cimi com os povos indígenas,
pois se trata de dar visibilidade à luta desses povos no intuito de ampliar os
seus aliados e apoiadores.
Ao longo das últimas décadas foi
sendo construído o entendimento de que no apoio aos direitos indígenas vai
consolidando um processo de conhecimento e solidariedade mútuo, que vai se
traduzindo em estratégias de apoio aos direitos humanos e étnicos dos povos
indígenas. Hoje existe uma ampla rede de apoiadores dos direitos dos povos
indígenas.
Terra: a questão central
Para o Cimi, a falta de
demarcação e garantia das terras indígenas tem gerado inúmeros conflitos em
todas as regiões do país, tendo sido assassinados vários missionários em função
do apoio aos povos indígenas na luta pela terra.
Em sua primeira Assembleia Geral,
realizada em junho de 1975 assim foi definida a linha de ação com relação às
terras indígenas: “Apoiar decidida e eficazmente, em todos os níveis, o direito
que tem os povos indígenas de recuperar e garantir o domínio de sua terra, nos
termos do Artigo 11 da Convenção 107 da OIT, uma vez que eles são os
proprietários originários e parte integrante da mesma terra. Terra apta e
suficiente para um crescimento demográfico adequado à sua realidade ecológica e
socioeconômica”.
Todo e qualquer prazo e paciência
já foram esgotados. Os povos indígenas não aguentam mais tamanha desfaçatez e
ignomínia. Até quando se irá continuar chamando de “invasão” o retorno a seus
territórios tradicionais – tekohá?
A grande questão que fica no ar
é: por que o Estado não cumpriu sua obrigação de demarcar todas as terras
indígenas, conforme ficou definido na Lei 6001, Estatuto do Índio, em que
consta o compromisso de demarcar todas as terras indígenas até o ano de 1978.
Em seguida, a Constituição Federal determinou que todas as terras indígenas fossem
demarcadas em cinco anos, portanto até 1993. Até hoje o Estado não cumpriu a
Constituição. Fica então no ar a questão: será que de fato se quer resolver
esse grave problema que atinge os povos indígenas? O que os políticos e
governos estaduais do Mato Grosso e posteriormente Mato Grosso do Sul, fizeram
para cumprir esse preceito constitucional?
Os fatos apontam para uma tenaz
resistência ao reconhecimento das terras indígenas em instância regional e
nacional. Esta nova CPI segue tal estratégia, de negação dos direitos dos povos
indígenas.
Mas sempre é tempo para lutar por
aquilo que é justo e inegociável, como o direito a terra e à vida dos povos
indígenas. E quiçá por suspiro fortuito das consciências responsáveis. Que a
CPI do Genocídio e a CPI do Cimi possam contribuir para o equacionamento da
gravíssima situação de violência e negação dos direitos fundamentais dos povos
indígenas no Mato Grosso do Sul.
Texto e fotos: Egon Heck
Cimi Secretariado
Brasília, 22 de abril de 2016.