ATL 2017

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quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Os Jogos Mundiais Indígenas e a violência




Falta um pouco mais de um mês para o início de um evento mundial congregando povos indígenas de 30 países e de 22 povos nativos do Brasil. O país tem se destacado, nos últimos anos, por ser anfitrião de grandes espetáculos esportivos como a Copa do Mundo em 2014 e se aproximam os Jogos Olímpicos Mundiais a se realizarem no Rio de Janeiro em 2016, portanto, há menos de um ano.  

Os Jogos Mundiais Indígenas se transformam em mais um momento projetado com grandiosidade, dentro de um pensamento ufanista, de vender e forjar a imagem de um país plural, democrático, sem racismo, que tenta ser justo e pacífico. Se isso fosse verdade seria o caso de invadirmos a velha Europa e quiçá a América do Norte com nossos projetos de Bem Viver e nossos exemplos de como salvar o Planeta Terra da total destruição. Longe disso. Nossos governantes fazem malabarismos para esconder que somos um dos países mais desiguais do mundo.

Se olharmos o país com um mínimo de realismo e isenção, a partir do que está acontecendo com os povos indígenas ultimamente, especialmente no Mato Grosso do Sul, teremos que reconhecer o fracasso de nossa pretensa democracia racial e colhermos mais um título, de estarmos entre os países de maior violência e negação dos direitos humanos e de povos à nossa população originária.

Mas nem tudo está perdido. Antônio Apinagé, do estado onde se realizarão os Jogos Indígenas, adverte: “O fato é que as terras dos povos Apinajé, Krahô, Karajá Xambioá e Xerente, já demarcadas, estão sendo invadidas ou encontram-se ameaçadas por hidrelétricas, hidrovias, eucaliptos, soja, mineração e madeireiras. E alguns povos ainda não têm sequer suas terras demarcadas. Por causa da luta pela terra, muitas lideranças indígenas estão sendo criminalizadas, presas, espancadas ou assassinadas a mando de fazendeiros e políticos” (Manifesto Crítico sobre os Jogos Mundiais Indígenas). Afirma ainda que “a melhor atitude pela paz é também demarcar e respeitar os territórios indígenas que são sagrados para nossos povos e necessários para o equilíbrio e a sustentação do clima no planeta terra”.

Lindomar Terena, do Mato Grosso do Sul, estado de maior violência contra os povos indígenas do Brasil, é enfático ao afirmar: “Estes jogos escondem a verdadeira face do Governo no massacre dos povos indígenas, elevando a imagem governamental e de alguns indivíduos enquanto se continua negando aos povos o direito sagrado a terra, a cultura, ao modo de vida originário... Somente a mobilização direta dos povos fará com que rompamos as cercas que nos separa do nosso bem viver. É a única ação que pode mudar esta triste realidade”.

Operação Dourados: Forças Armadas na fronteira com o Paraguai

Num comunicado reproduzido pela imprensa regional (Diário do MS), o Comando Militar do Oeste informa que a operação militar na fronteira estará integrada de 1.200 a 1.500 homens do Exército, que estarão se somando aos já presentes na região, tanto da Força Nacional, como DOF (Destacamento de Operação na Fronteira). O objetivo declarado é de “implantar a Lei e a Ordem”. Se a esses contingentes agregarmos as centenas de fazendeiros, pistoleiros e forças paramilitares fortemente armados veremos que estamos num cenário de guerra. Contra as armas de grosso calibre os mbaracá e as flechas. Se as comunidades indígenas não tiverem seus direitos respeitados, especialmente a sua integridade física, a lei e a ordem que as Forças Armadas irão defender terá lado. Será lastimável se isso vier a ocorrer. Os povos indígenas não terão para onde correr. Já percorreram todos os caminhos da justiça e de seus direitos. A paciência já se esgotou.

Na guerra a esperança avança

O que nos deixa extasiados e esperançosos é a capacidade desse povo de fazer da dor uma flor, uma semente, uma razão para avançar. O sangue derramado se transforma em novos e abundantes guerreiros.

A esperança vai se transformando em gestos concretos de solidariedade e de convocação à luta pela justiça.

Lembro com muita emoção e gratidão, as recepções na comunidade de Guyrá Kamby’i, com rituais e sorrisos. Apesar de seu território tradicional ser dos mais documentados historicamente, conforme declaração do antropólogo do Ministério Público Federal de Dourados, Marco Homero, essa comunidade tem sobrevivido em apenas dois hectares.

Nesta semana, Dom Juventino, do leito do hospital, enviou ao povo de Deus da Diocese de Rondonópolis uma bela mensagem conclamando a solidariedade com aqueles que mais sofrem no mundo de hoje, lembrando a morte de uma criança kurda e dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul: “Povos indígenas do Mato Grosso do Sul, povos nativos, com nosso apoio e solidariedade teus filhos vão ver dias melhores e condições de vida digna”.

Egon Heck
Secretariado Cimi

Brasília, 9 de setembro de 2015.