Assim poderíamos caracterizar a
estratégia do agronegócio, bancada da bala e setores antiindígenas para esse
dia 2 de setembro. Na pauta, a aprovação do relatório da Comissão Especial da
PEC 215, na Câmara dos Deputados, que Daniel Guarani-Kaiowá chamou de PEC do
genocídio. Em Campo Grande, capital do Estado mais violento e antiindígena do
país, assinaturas foram coletadas para a instalação de uma CPI (Comissão
Parlamentar de Inquérito) contra os direitos indígenas, denominada CPI do Cimi.
Repete-se a mesma estratégia de 1987, quando, por ocasião da
Constituinte se instituiu no parlamento brasileiro a CPMI (Comissão Parlamentar
Mista de Inquérito) com o intuito de impedir a conquista dos direitos indígenas
na Constituição. O mecanismo que as mineradoras, políticos, setores militares,
madeireiras, latifundiários utilizaram foi exatamente o mesmo: atacar os
direitos indígenas atacando seus aliados, particularmente o Cimi.
Naquela ocasião, Dom Luciano Mendes de Almeida, então
presidente da CNBB, de forma brilhante fez a defesa dos povos indígenas, da
verdade e do Cimi. E a farsa, as mentiras foram desmascaradas e os direitos
indígenas conquistados.
Velório nos
três poderes
Depois da caminhada com o caixão e muita indignação pelo
espaço dos poderes, sob um sol escaldante e abrasador, finalmente lideranças
indígenas de vários povos e entidades aliadas de todo o país, chegaram à rampa
do Congresso. De pressa as forças de segurança impediram a continuidade da
caminhada. “Nós apenas queremos colocar aqui, diante dessa casa onde se
encontram cúmplices do assassinato de nossa liderança Simeão Kaiowá Guarani de
Nhanderu Marangatu, do Mato Grosso do Sul, fronteira com o Paraguai. Que venham
os parlamentares envolvidos nesse assassinato. Vejam no caixão nosso irmão
assassinado...”, desabafou uma das lideranças desse povo, em meio a rituais
para espantar os maus espíritos.
O caixão contendo o nome de vários
inimigos dos índios no Mato Grosso do Sul, foi abandonado na rampa da casa do
povo, causando um constrangimento na segurança que não sabendo como proceder,
veio pedir aos índios para retirarem o caixão. Ao que prontamente veio a
resposta: “O caixão é de vocês. Ali estão assassinos dos povos indígenas”.
Antes da ida à rampa do Congresso, foi feita uma parada, em
frente ao Palácio do Planalto. Lá foi exigida da presidente da República a imediata
retomada da demarcação das terras indígenas, como condição fundamental para
impedir o derramamento de sangue e mais assassinatos no Mato Grosso do Sul e em
todo o país.
Um dos momentos fortes do velório de Simeão Kaiowá Guarani
foi diante do Supremo Tribunal Federal. Ali foram feitas falas indignadas pela
omissão e inércia do Poder Judiciário, que é ágil contra os índios e moroso
quando se trata da garantia dos direitos indígenas. Foi lembrado que fazem dez
anos que ali se encontra uma de ação que suspendeu a homologação de 9.300 hectares
(dos quais os índios estão confinados em apenas 126 hectares). Houve a promessa
de retomada do julgamento desta ação, com a máxima agilidade. As lideranças da
área estiveram inúmeras vezes no STF e obtiveram do então relator da ação, ministro
Cezar Peluzo, a promessa de que já estava com seu relatório pronto e que
agilizaria a decisão. Até hoje nada. A relatoria está atualmente com o ministro
Gilmar Mendes!
Celebrando a
esperança e indignação
A caminhada do velório iniciou em frente à Catedral, com uma
primeira parada no Ministério da Agricultura, de Kátia Abreu, inimiga ferrenha
contra os direitos indígenas e pela expansão do agronegócio, numa onda de
destruição ambiental, sem precedentes na história desse país.
E foi na Catedral de Brasília que às
20 horas se encerrou a manifestação contra a violência, os assassinatos dos
irmãos índios, com um culto ecumênico articulado pelo Conselho Mundial de
Igrejas.
Lá estavam lideranças indígenas e aliados. Lá estava a
esperança. Nas preces e nas falas o apelo de socorro da Mãe Terra e de seus
filhos primeiros, originários, os povos indígenas.
Assim como a ação violenta e apressada dos fazendeiros e
seus pistoleiros, dos políticos e seus sequazes, do grande capital nacional e
internacional com seus tentáculos insaciáveis de lucro e acumulação, a
esperança e a paz avançarão rumo à justiça com igualdade e diversidade
respeitada.
Se hoje os ruralistas têm balas e pressa, certamente esse
dia passará para a história como mais uma luta extremamente desigual, mas
heroica dos habitantes originários desse continente e seus aliados, e todos os
batalhadores da vida e sobrevivência do planeta terra.
Egon Heck – fotos Laila Menezes
Secretariado do Cimi
Brasília, 2 de setembro de 2015