ATL 2017

ATL 2017

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Kaiowá Guarani: a bem da verdade e da justiça



Estamos diante de uma realidade estarrecedora. De um lado uma população originária invadida e maltratada pelo projeto colonizador, hoje transvestido de agronegócio e força paramilitar, tendo a seu serviço um Estado omisso e conivente. As consequências são as mais drásticas imagináveis: centenas de indígenas covardemente vilipendiados e violentados em seu direito mais sagrado, seu tekohá, seu território tradicional. Uma liderança assassinada, uma dezena de feridos, e um ódio mortal disseminado nos meios de comunicação. “Vamos tirá-los no peito e no grito”, vociferou a presidente de um sindicato rural.  Fazendo coro à ofensiva genocida nas redes sociais são alardeados os gritos de “temos que matar esses índios”.


As armas da mentira e do ódio

O maquiavelismo e o cinismo são tamanhos que chegam às raias do absurdo de afirmarem que Simião Vilhalva teria sido morto por indígenas. E onde estão os corpos do professor indígena Rolindo Vera, do cacique Nizio Gomes, do jovem Kaiowá Guarani sumido numa das retomadas de Pyelito Kuê?  Quantos indígenas já não foram assassinados em Nhanderu Marangatu, na total impunidade, como no caso de Marçal, Dorvalino e agora Simião?

A forma como estão incitando a população contra os índios configura uma nítida intenção genocida. Não é possível que tamanhas incitações ao ódio e violência sejam toleradas num estado que se diz democrático e de direito.  São os índios do Paraguai que estão para invadir o Mato Grosso do Sul? Não é exatamente o grande capital agroindustrial, nacional e estrangeiro, e do agronegócio que estão se apossando da maior parte do território do estado, inclusive as terras indígenas?

 Jogos Mundiais Indígenas, assassinatos, violência e ódio

Nhanderu Marangatu é o desmentido mais cabal do que os organizadores dos jogos e o governo brasileiro insistem em levar ao mundo: a imagem de um país pacífico, respeitador dos direitos e das vidas de sua população originária.

Não seria mais coerente demarcar as terras indígenas, punir exemplarmente os assassinos das lideranças, e só depois pensar na realização de Jogos Mundiais Indígenas no Brasil? Enquanto o chão brasileiro continuar sendo manchado com o sangue de seus povos originários, será uma falácia fazer o mundo crer naquilo que não somos. Não seria mais coerente usar esses recursos para regularização das terras indígenas?


As olimpíadas mundiais estão à porta.  É essa a melhor forma de mostrarmos que país é esse.

Professores indígenas na luta

“Nossas lágrimas vão alimentar nossas raízes”, afirmou sensibilizado e indignado Anastácio Kaiowá Guarani. “Os que tombaram estão junto de nós nos dando força, pois morrer por uma boa causa, nos deixa feliz”. Solicitou a solidariedade de todos contra o brutal assassinato de Simião Vilhalva. Em homenagem à memória dele e de todos os que tombaram na luta por direitos, foi feito um minuto de silêncio.

No início do encontro nacional de professores indígenas, que tem como um dos objetivos a organização dos professores indígenas em nível nacional, através da criação de um Fórum, Gersen Baniwa ressaltou que “esse é um pontapé inicial, é uma sementinha, que esperamos cresça rapidamente”. Ressaltou que esse é um dos momentos mais difíceis do período pós-ditadura militar.
Egon Heck
Cimi – Secretariado Nacional

Brasília 31 de agosto de 2015

domingo, 23 de agosto de 2015

Nhanderu Marangatu: A volta à terra tradicional



A ansiedade e disposição eram grandes.  Os guerreiros, rezadores e famílias estavam esperando, agoniados, os ponteiros juntos apontarem para as estrelas. Esse era o horário que os deuses, através dos nhanderu (líderes religiosos) haviam marcado para o retorno ao território tradicional. Resolutos marcham para a terra sagrada. Com a proteção divina e a certeza de que esse gesto extremo era a única alternativa que lhes restava. Contavam com a solidariedade de amigos e aliados do mundo inteiro.

O sonho de Marçal e Dorvalino



Na noite de 25 de novembro de 1983, na aldeia de Campestre, munícipio de Antônio João, Marçal Tupã’i foi covardemente assassinado. Seu sonho era ver a terra de seu povo e de outras aldeias terem seus tekoha (terras tradicionais) demarcadas. Dezenas de crianças e adultos foram mortos por atropelamentos, fome, e toda sorte de violência.

A Aty Guasu já se manifestou: “Nosso tekoha finalmente acordou e se revestiu mais uma vez do sonho de Marçal. Alimentados por esse sonho, quase 300 indígenas já retornaram a terra, no momento na Fazenda Primavera”. As vozes de Nhanderu Marangatu, que por motivos de segurança não querem ser identificadas denunciam: “As mãos que nos alimentavam e eram amigas enquanto estávamos sem a terra são as mesmas que apertam os gatilhos e ordenam nossa morte quando queremos nossa terra de volta”.

 Em nome de Hamilton Lopes que faleceu em 2012, de Marçal de Souza, assassinado em 1983, Dorvalino, assassinado em dezembro de 2005, de Dom Quitito, que morreu em abril de 2000 e de todos os heróis guerreiros e inocentes crianças que morreram e a todos os que deram sua vida para que o sonho da terra, paz e dignidade se tornassem realidade.

Dez anos após a homologação da terra e do despejo, dez dias após o encontro com o ministro da Justiça e visita a gabinetes do STF, e uma semana após ruralistas da região afirmarem que não existiam conflitos na região.
“Pisaram em cima de nós
Mas ainda temos raiz,
Vamos brotar, crescer
E dar frutos”
(Hamilton Lopes, 15 de dezembro de 2005)

 

Por volta das 9 horas chega um contingente policial para expulsar os índios de seu tekoha. Algumas dezenas de indígenas e aliados haviam feito uma vigília a noite toda.  Haviam se concentrado ao lado da rodovia, na aldeia de Campestre. Várias viaturas foram chegando e trancando a rodovia. Fortemente armados, com cachorros e um helicóptero sobrevoando o local. Os rasantes de um helicóptero amedrontaram, principalmente as crianças, que em pratos, escondiam seus rostos a cada investida da aeronave.
Veja vídeo


Os policiais foram ao encontro dos indígenas. As lideranças tentaram demovê-los do despejo. Uma professora indígena suplicava que não os expulsassem, eles também eram gente e apenas estavam defendendo o que tinham de mais sagrado, sua terra.
Suas súplicas não foram atendidas: “Estamos aqui cumprindo ordem”.

Sequer haviam se cumprido as formalidades da expulsão, com a presença do Ministério Público, através do procurador Charles Pessoa, e os fazendeiros e seus capangas foram colocando fogo nos barracos dos indígenas, tendo alguns sido queimados com os documentos e todos os pertences dentro.

“O que pensam que somos,
Esses que fazem isso conosco,
Que somos animais ou traficantes,
Para virem tirar nós daqui
Com fortes armas?
Não precisavam” (Hamilton)

 História da violência e resistência




Quando a expulsão ocorreu era manhã. A comunidade, atônita, não queria acreditar que tinham sido expulsos de sua terra. Mas o inacreditável aconteceu. Mais de 500 índios foram despejados para a beira da estrada, naquele fatídico dia 15 de dezembro. Começava então um longo caminho de sofrimento, luta e resistência. Dez dias depois, véspera de Natal, um segurança de uma milícia armada, contratada pelos fazendeiros, assassinou, próximo ao acampamento e dentro da terra indígena, a liderança Dorvalino.

Dois dias depois do despejo uma delegação indígena foi até Brasília para denunciar mais essa violência. Na capital federal era tempo de não trabalhar, tempo de recesso. Porém, conseguiram em alguns gabinetes do Supremo Tribunal Federal a promessa de que na volta aos trabalhos, a ação seria julgada com urgência. No INCRA a comissão recebeu a promessa de que os 50 não indígenas que estavam na localidade Campestre, dentro da terra indígena, seriam reassentados, a partir de janeiro de 2006. Passaram-se dez anos e absolutamente nada aconteceu.

Em junho de 2005 o presidente Lula havia homologado a demarcação da terra indígena Nhanderu Marangatu, de 9.300 hectares. Em seguida, o então presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, anulou, liminarmente, a homologação. A partir daquele momento a população Kaiowá Guarani desta terra passou por uma década de sofrimentos e mortes, confinados em 126 hectares.

As comunidades declaram assim: “hoje depois de esperar mais de 18 anos de posse de tekoha reocupamos definitivamente, aqui reocupamos nossa terra e não vamos mais sair de nossa terra Marangatu. Nós estamos aqui ameaçados de morte, cercado de pistoleiros armados, mas não vamos recuar. Decidimos lutar e morrer pela nossa terra. “Informamos a todas as autoridades federais que reocupamos a nossa terra tekoha Nhanderu Marangatu, daqui não saímos nem vivos e nem mortos". (site Aty Guasu, 22 de agosto de 2015)

Egon Heck

Cimi Secretariado Nacional


Brasília 22 de agosto de 2005.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Povo Kanela Apanyekra do Maranhão: falando ao coração



Um convite, uma missão, uma luta. Uma delegação do povo Kanela deixa a tranquilidade da grande aldeia de Porquinhos, com mais de 800 habitantes, rumo a Brasília. Não vieram dizer apenas que existem, mostrando seus rostos cansados, mas sorridentes e confiantes, de um povo guerreiro, do tronco linguístico macro-jê, da nação Timbira. Vieram exigir direitos, falando ao coração de ministros, senadores e deputados.

Apesar de um século e meio de contato com a sociedade, envolvente, invasora, vivem conforme sua cultura e costumes. Mal conseguem se expressar em português. As mulheres praticamente só se comunicam em sua própria língua.

Terra é nossa luta

Vieram tratar de uma questão muito especial e preocupante: a demarcação e garantia de seu território. No dia 30 de setembro do ano passado, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal anulou a portaria 3.058 de 21/10/2009 do Ministério da Justiça. Definidos os limites da terra, foi iniciado o processo de demarcação física, conforme previsto no Decreto 1775/96. Porém, o trabalho foi paralisado por pressão dos interesses políticos e econômicos da região. A comunidade indígena ficou então em total insegurança, sem saber ao certo porque os organismos dos “Kupen” (não índios) estavam impedindo a demarcação de seu território tradicional. Decidiram então vir a Brasília para saber ao certo do que se tratava e conversar diretamente ao coração dos responsáveis, falando da necessidade da demarcação daquelas terras e narrando a história de massacres, invasões e violências a que os “Mehin” (indígenas) foram submetidos nessas últimas décadas.

“Não viemos com arco e flecha brigar pelos nossos direitos. Viemos armados com a memória do nosso sofrimento para levar ao coração dos ministros que decidem sobre nossas terras e nossas vidas. Queremos mostrar a eles nossos rostos de mulheres, crianças, anciãos e guerreiros. Pedimos a eles que façam justiça, reconheçam nossas terras, que precisamos para viver em paz, com alegria e a sabedoria do nosso povo”.  Dessa forma, Elias Apanyekra externou o desejo de sua gente, que não quer ser destruída.

Visitas, falas e apoios



Os Apanyekra tiveram um dia diferente do que quando estão na mata, no roçado ou no rio, na aldeia. Enfrentaram as longas caminhadas dos corredores no emaranhado de gabinetes de parlamentares e ministros. Em quase todos os lugares foram recebidos com simpatia e com a promessa de apoio a seus direitos. Foram econômicos nas palavras, mas eficazes o suficiente para dar o seu recado. A simples presença nos corredores e gabinetes com seu jeito Timbira de ser propiciou várias manifestações de solidariedade e reconhecimento. “Esses são os primeiros brasileiros”. “É muito importante vocês estarem aqui”. “Contem com o nosso apoio às reivindicações”. “Tragam o registro de todos esses massacres do vosso povo para podermos ajudar melhor”.

Vários parlamentares pediram para tirar fotos para colocar no facebook. O deputado Tiririca, com seus cabelos brancos e jeito brincalhão, chamou a atenção no corredor do quinto andar do anexo IV.

Hoje estarão visitando senadores e mostrando seus rostos aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), marcando presença no plenário, mostrando que existem e que são atingidos por suas decisões.
“Viemos falar do nosso sofrimento. Fomos massacrados, invadidos e agora vemos com muita dor as nossas terras tradicionais sendo ocupadas pelos fazendeiros, com plantação de eucalipto e soja. Os caçadores entram em nossas terras e estão acabando com os animais. Mas quando vão demarcar nossa terra, vamos fazer festa. Os macacos bugios vão ficar alegres, podem também viver em paz”. Dessa forma, Manoel Apaneykrá externou sua confiança de verem suas terras demarcadas e livres de invasões.

Egon Heck
Cimi Secretariado Nacional

Brasília, 20 de agosto de 2015.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

AGENDA genocida BRASIL


Quando se pensava que os abomináveis decretos de morte contra os povos indígenas estariam superados e finalmente a justiça abriria suas asas sobre um milhão de nativos originários deste país, é anunciado um novo plano genocida e etnocida. Desta vez a iniciativa vem do presidente do Senado, com o aval complacente do governo.  É a agenda mata índio Brasil.
O que os povos indígenas poderão esperar do casamento do modelo ultra neoliberal, com o sistema desenvolvimentista ora em curso?
Pela primeira vez, desde o “milagre brasileiro” no início da década de 1970, os povos indígenas são explicitamente intimados a uma agenda de entrega de seus territórios e recursos minerais à sanha dos interesses econômicos e políticos no poder. São acusados de serem obstáculos para a superação da crise por que passa o país. É a versão atualizada do Projeto de “Emancipação” do ministro do Interior, General Rangel Reis. É a tentativa de impor o projeto da “aculturação”, que Bernardo Cabral tentou impor aos povos indígenas com seu substitutivo na Constituinte em 1.988. É a proposta de criação das colônias Indígenas, com lotes de terra por família indígena, que o Projeto Calha Norte tentou impor, a partir de 1986. Enfim, é o resumo de todas essas propostas antiindígenas que voltam com essa Agenda proposta por Renan Calheiros, presidente do Senado.
As terras indígenas são consideradas entraves para a recuperação da atual crise por que passa o país.  Como sábia medida redentora propõe-se a revisão dos marcos jurídicos que possibilitem acelerar as obras de infraestrutura. A proposta tem o claro objetivo de transformar essas terras em locais de atividades produtivas, torná-las rentáveis, ou seja, disponibilizá-las à agenda do agronegócio.
“Não se leva em conta, como de costume, os povos tradicionais que ali habitam, suas culturas e hábitos, e muito menos os serviços prestados por estes territórios preservados, como a regulação climática, a produção de chuvas e a manutenção da biodiversidade, entre outros. A proposta também quer incentivar a mineração a partir da implementação de um novo marco jurídico para o setor. Isso vai gerar uma corrida, sem regra conhecida e com potencial dramático de destruição, às riquezas que hoje pertencem à União” (Greenpeace, 11/08/15).
Diante de mais essa ameaça, os povos indígenas mobilizados em Brasília manifestaram sua repulsa a mais esse plano de morte, e reafirmaram sua disposição de retornar aos territórios tradicionais dos quais foram expulsos, e realizarem aos autodemarcações de suas terras.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB também condenou veementemente mais essa ameaça de morte: “Nós somos filhos da terra, alimentados pela força espiritual dos nossos ancestrais, e é por ela e por toda a Natureza e todo Ser que soltamos o nosso canto e clamor, e erguemos os nossos maracás, nossos punhos e arcos para lutar em defesa da vida e dos direitos, das nossas atuais e futuras gerações” (Manifesto dos Participantes do II Encontro Nacional de Culturas Indígenas e APIB- São Paulo 15/08/15).

Resistência indígena vence ministro

Na semana passada, a delegação dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, permaneceu por mais de dez horas no auditório do Ministério da Justiça, com a firme determinação de que de lá não sairiam sem ter um encontro com o ministro José Eduardo Cardozo.
Na carta entregue ao ministro da Justiça e a representantes de outros ministérios, os índios foram categóricos: “Assim como os senhores, que representam o Executivo brasileiro estão hoje articulados com os poderes Legislativo e Judiciário, empenhados na defesa do ruralismo, promovendo a paralisação política das demarcações de nossas terras tradicionais e o extermínio de nossos direitos previstos na Constituição de 1988, nós povos indígenas queremos dizer que também estamos articulados para retomar nossos territórios e garantir na prática a vida e a cultura de nossos povos, mesmo que isso signifique nossa morte, morte que o Governo e o Estado brasileiros decretam quando nos condenam a viver na beira das rodovias em condições sub-humanas de vida”.
Recado sem rodeios

“Nós, povos indígenas a muito deixamos de sermos tutelados, e dizemos aos senhores que temos plena capacidade de analisar a conjuntura política e compreender as relações que se estabelecem para diminuir e atacar nossos direitos. Exigimos respeito e repudiamos os discursos demagógicos que os senhores fazem para enrolar nosso povo. Voltamos a insistir senhores. Não queremos discursos. Fomos claros e objetivos, queremos respostas claras e objetivas para nossas exigências” (Documento entregue a ministros e seus representantes).

Egon Heck
Cimi Secretariado Nacional
Brasília, 17 de agosto de 2015.



quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Povos originários: que os ministros nos ouçam

Povos originários: que os ministros nos ouçam

Mais um dia agitado. Brasília é o palco móvel em que se mobilizam setores do governo, da sociedade e dos povos originários. Tudo deve ser minuciosamente avaliado para não transpor águas de um para outro rio. Nesse jogo de xadrez, de interesses e poder é preciso pressa, astúcia, habilidade e sabedoria. E muita espiritualidade, rituais e rezas.





De um lado florescem margaridas e ostentam sua resistência e vida, no seco e árido planalto central. Do outro lado maquinações maquiavélicas induzem a caminhos floridos para além das pedras e espinhos. Para os povos de cinco séculos de opressão só resta a opção de lutar, enfrentar todos os dragões com as armas do futuro, da construção coletiva da sociedade plural, de novos projetos de sociedade.

A educação e escola aguerrida

Neste dia 11 as delegações indígenas do sul do país e do Mato Grosso do Sul tiveram uma agende importante e gratificante no Ministério da Educação.  Sem nenhuma ilusão ou expectativa salvacionista, foram dizer a responsáveis pela Educação Escolar Indígena, suas angústias sonhos e lutas por uma efetiva educação diferenciada, combativa e de qualidade.

Puderam expor detalhadamente o sofrimento, a miséria e a fome que passam inúmeras crianças indígenas, nos acampamentos, nas retomadas, nas áreas de conflito e nos confinamentos. Centenas delas estão fora do sistema escolar por negligência dos poderes responsáveis, nos estados e municípios. Os professores e lideranças Kaiowá Guarani denunciaram os inúmeros casos em que os municípios se negam a construir escolas nas áreas de retomadas e acampamentos indígenas.  Dos representantes da Secadi (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, diversidade e Inclusão) receberam a informação de que não existe nenhum empecilho legal nesse sentido. Pelo contrário, a Constituição e outras normas obrigam os poderes públicos locais a garantir escolas para as crianças indígenas, estejam onde estiverem.

Da delegação de mais de 40 participantes do debate, mais de 30 eram professores indígenas. Mostrando clareza política de seus direitos, que são os direitos de seus povos, denunciaram os inúmeros descumprimentos das leis, da inviabilização, na prática, de escolas verdadeiramente indígenas, relataram inúmeros fatos de violência e omissão do governo especialmente na garantia de seus territórios.

Os representantes do ministério ouviram atentamente os relatos, as denúncias e as cobranças, e reafirmaram o compromisso de se empenhar na solução de várias questões práticas relacionadas à Educação Escolar Indígena, e parabenizaram os professores, especialmente do Mato Grosso do Sul pela sua compreensão e luta política por seus direitos.

Ficou agendada para este mês, a ida de representantes do ministério ao cone Sul do Mato Grosso do Sul, ocasião em que visitarão aldeias e acampamentos indígenas. Posteriormente, o ministro da Educação estará indo à região para contatos diretos com as realidades prementes das populações indígenas locais.

Segundo Censo de 2.014 são 3.160 escolas indígenas, com um total de 239.666 alunos, 18 mil professores indígenas e aproximadamente 13 mil indígenas nas universidades. Sem ilusões quanto às reais possibilidades de autonomia de suas escolas, exigem justiça e punição aos seus colegas Genivaldo e Rolindo Vera assassinados quando retornaram com seu povo à terra tradicional do Ypoi, no município de Paranhos. Os assassinos continuam soltos e o corpo de Rolindo até hoje não foi encontrado.

Indígenas fecham pistas de acesso ao Palácio do Planalto

Indignados com a morosidade e o descaso em cumprir a promessa de serem recebidos por ministros de Estado, a delegação indígena trancou novamente, no início da tarde de ontem, a rodovia em frente ao Palácio do Planalto. Representantes do governo federal haviam se comprometido a agendar reuniões com representantes dos ministérios da Justiça, Desenvolvimento Agrário, da Fazenda, da Casa Civil e Secretaria Geral da Presidência da República, além da Advocacia Geral da União e do Presidente da Funai. Prontamente policiais foram novamente posicionados e a polícia de choque com cães foram colocados de prontidão.

Em nova rodada de negociação ficou acertada uma conversa prévia com representantes dos ministérios e uma agenda conjunta com os ministros acima relacionados, para quinta-feira, dia 13.
No encontro com a participação de toda a delegação indígena e apoiadores, realizada no Ministério da Justiça, se percebeu que praticamente nada mudou nos discursos e posicionamentos desses órgãos públicos.

Egon Heck
Cimi Secretariado Nacional
Brasília, 11 de agosto de 2015.





quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Presidente da Funai na fronteira com o Paraguai

Não é por acaso ou fortuitamente que o novo presidente da Funai, João Pedro, do PT do Amazonas, vem ao Mato Grosso do Sul, logo no início de sua gestão. Com dois meses no cargo teve seu primeiro  embate com uma delegação indígena.  Os Pataxó, em cujo território iniciou a invasão do até então desconhecido continente, Ameríndia. Depois de mais de 500 anos de resistência, não mais acreditam em  promessas ou  falas enganosas   feitas pelos  neocolonizadores e e terminadores dos povos originários.




Mas seus representantes continuam insistindo e jurando que estão bem intencionados, mesmo repetindo as velhas mazelas de tutores com ares de superioridade.

Por que vem correndo até o  Mato Grosso do Sul? Para resolver o gravíssimo problema da demarcação das terras indígenas ou para socorrer a Biafra brasileira como é conhecida a região de pior violência e negação dos direitos indígenas.  Se nos governos Lula e Dilma tivessem demonstrado vontade política em resolver o problema, que sabidamente não é fácil, mas absolutamente factível ,  certamente os povos indígenas da região, especialmente os Kaiowá Guarani e os Terena, não continuariam vendo suas lideranças diariamente ameaçadas e assassinadas.

Mas porque então João Pedro vem à região?  Será porque as Olimpíadas vem aí  e a imagem do país mão pode estar manchada ou conspurcada por ações ao arrepio da lei e dos direitos, violando a Constituição?

Uma coisa é certa. Não é por falta de conhecimento da realidade que se está deixando de agir em favor da vida dos povos indígenas da região e do país. Pilhas de relatórios e documentos devem estar entulhando as gavetas dos  senhores dos três poderes. É obstinação em não cumprir a lei em favor dos historicamente oprimidos e rejeitados povos originários.

A boa vontade ao avesso




Será que existe boa vontade e disposição de resolver essa situação de envergonha a todos nós cidadãos desse país? Que falem  os fatos.  A Terra Indígena Buriti foi durante anos  exaltada e endeusada pelo Ministro da Justiça, como a única forma de resolver o problema através da mesa de negociação. Depois de  dois  anos os fazendeiros deram uma banana ao Ministro e um adeus  à solução por negociação e diálogo. Quando, no governo Lula houve um tímido sussurro de começar a resolver o problema das terras, sinalizando para a indenização e compra de terras, a Famasul se dispôs de fazer o levantamento das terras que estariam à disposição para serem compradas. Um número ínfimo de proprietários se dispuseram  a vender as terras.  E assim poderíamos levantar inúmeros fatos que  sinalizam claramente que o que não se quer é que a Constituição seja cumprida e as terras indígenas demarcadas. Salta à vista que o que prevalece é uma boa vontade às avessas.


CPI do Cimi

Diante do quadro desolador e vergonhoso, da violência genocida, da discriminação e racismo, é preciso achar um bode expiatório.  Repete-se a mágica de quase meio século. Realiza-se uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Forjam-se acusações falaciosas,  mentiras são plantadas como verdades.

“Em outra vertente, a Assembleia Legislativa deve averiguar denúncias contra o CIMI (Conselho Indigenista Missionário) que, além de incitar invasões, tem orquestrado o confronto armado, colocando em risco a vida de índios e não índios.” Afirmações da deputada estadual Mara Caseiro. (Ponta Porã Digital 7/08/15)

João Pedro em Guaivyri e Ypoi

O presidente da Funai   estará visitando nesta tarde duas aldeias onde foram utilizadas as mesmas estratégias de assassinar e ocultar o cadáver como forma de dificultar a elucidação dos crimes. Até hoje o corpo do professor Rolindo Vera, do Ypoi e do cacique Nizio Gomes, do Guayviri, não foram encontrados.

Ao passar pelos acampamentos certamente será impactado pela extrema pobreza e dificuldades em que sobrevivem essas populações. Diante desse quadro estarrecedor, radicalmente diferente da maioria dos povos indígenas da Amazônia que pelo menos tem seus territórios demarcados.

Certamente o presidente da Funai sairá com o coração na mão e apesar das mãos amarradas pela burocracia e os interesses políticos e econômicos certamente, se empenhará em minorar a gravidade da situação.

Aos povos indígenas resta a resistência ativa, no caminho  para seus tekohá, suas terras tradicionais. Para isso contam com a solidariedade nacional e internacional, com a força dos nhanderu e guerreiros.

Egon Heck
Secretariado Nacional do Cimi
Dourados, 8 de agosto de 2015