ATL 2017

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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Revisitando o Congresso


Os corredores do Congresso se vestiram de belas e múltiplas cores, nessa manhã de quarta feira. Olhares curiosos, diante de cenas diferentes. Expressões de admiração, de carinho e de curiosidade, considerado exótico.  “que lindos, um mais lindo que o outro”, é o que exclamou  uma anônima funcionária do Congresso. Outros pediam para tirar fotos com os índios. Assim como há vinte e três anos atrás, por ocasião da Constituinte, os indígenas voltam ao Congresso, aos gabinetes dos parlamentares para dizer “estamos aqui. Voces aprovaram a lei maior, mas não a cumpriram. Estamos em luta pelos nossos direitos. Há mais de duas décadas estivemos aqui, ainda um tanto temerosos, mas combativos. Hoje voltamos indignados e revoltados, porque o Estado brasileiro não cumpriu a lei, e ainda ameaçam suprimir nossos direitos”

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O horizonte ainda se pintava de um forte amarelo/laranja, inspirando extasiante beleza, quando os guerreiros e caciques  de Rondônia em Brasília, se enchiam de  redobradas energias para mais uma jornada de luta pelos seus direitos. Na agenda um café de manhã com deputados. A rigor denominado de  “café contra a PRC 215”, pelo deputado  Sarney Filho. Foi um momento de traçar estratégias para os duros embates que os  povos indígenas, as populações tradicionais e os pobres desse país.
Nos gabinetes as cenas se repetem. Olhares curiosos, fotos e manifestação de simpatia pela causa e os direitos indígenas. “É importante vocês fazerem essas visitas aos parlamentares para sensibilizar  sobre as lutas e direitos de vocês. Vamos olhar com carinho essa questão.”

Outro deputado, mais expansivo, gritou “que entrem os indígenas”. Pediu que um indígena sentasse em sua cadeira para simbolizar o apoio à causa. Porém mostrou-se desinformado quanto ao tema e confidenciou “Hoje de manhã (ruralistas) ainda passaram aqui pedindo que apoiasse a urgência na tramitação da PEC 215. Agora estou entendendo melhor a questão. Contem comigo.
Ao entregar o documento nas lideranças dos partidos, os assessores logo diziam saber do que se trata e que imediatamente fariam chegar o documento e o pedido de rejeição da PEC ao líder do partido.

 Sem mobilização não há salvação


Nas manifestações do dia de hoje no Congresso, mais de 20 falas  deixaram claro a gravidade do momento.  Foram unânimes em afirmar a importância da mobilização indígena, como única forma de fazer o enfrentamento com as forças anti-indígenas. E para isso precisam contar com o máximo de apoio e solidariedade da sociedade brasileira e dos segmentos mais combativos que lutam por um outro modelo de desenvolvimento.  Alguns parlamentares se referiram à situação de barbárie e violência institucional que precisa ser combatida.

Chico Alencar salientou que é preciso  ampliar as mobilizações das praças aos palácios. Lembrou que o governo é refém dos ruralistas, tornando a correlação de forças péssima,  num  amplo processo de fechamento.

Outra tecla em que houve insistência foi a necessidade de avançar nas alianças e soma de esforços no enfrentamento. Foi ressaltado que a questão ambiental ficou fortalecida no novo Congresso, mas que é preciso aprofundar as alianças desse setor com os povos indígenas, quilombolas, populações tradicionais dentre outros.

O secretário do Cimi destacou a gama de iniciativas anti-indígenas não apenas no Congresso mas também no poder Executivo e algumas decisões do Judiciário.
O que está em jogo não são apenas os territórios indígenas, mas a própria vida no planeta Terra.

 Homenagem ao guerreiro e lutador Aniceto Xavante

Neste início desta semana faleceu uma das grandes lideranças que se notabilizou nas lutas pela terra de seu povo Xavante e na participação expressiva no inicio do novo movimento indígena que se forjou a partir do  da década de 70 e teve nas Assembleias Indígenas, seu grande instrumento de combatividade.

Aniceto, em seus 87 anos de vida não apenas lutou pela terra e direitos do povo Xavante, mas foi protagonista de vários momentos da luta dos povos indígenas, nas Assembléias  Indígenas nacionais e quando, em nome dos povos indígenas do Brasil, entregou ao  presidente Geisel documento pedindo que rasgasse o famigerado “projeto de emancipação” ( roubo das terras indígenas).

Egon Heck
Cimi secretariado nacional

Brasília 25 de fevereiro de 2015

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Os Suruí e o projeto carbono - Para que o mundo saiba


“Queremos a suspensão imediata desse projeto de carbono, que está matando o povo Surui”. Essa foi a reivindicação de todos os caciques e lideranças do povo Suruí, na audiência por mais de três horas, no auditório do Ministério Público Federal. Deborah Duprat, coordenadora da 6ª Câmara, ouviu atentamente e debateu com a delegação dos Povos Indígenas de Rondônia, num clima de muita confiança e franqueza. Após breve apresentação, Deborah manifestou estranheza sobre a presença de alguns seguranças  no auditório. Após indagar quem os teria enviado a esse espaço, comentou: “Nós nunca precisamos de tais presenças em nossos encontros com os povos indígenas. Por isso peço a vocês que se retirem”. Apesar de terem confidenciado que estavam ali por ordem superior, retiraram-se do recinto.

“Essa para mim talvez seja uma das atividades mais importantes da nossa vinda a Brasília”, comentou Antenor Karitiana. De fato, o Ministério Público Federal tem se transformado num dos importantes espaços de luta e garantia dos direitos dos povos indígenas. Apesar da estrutura de funcionamento impor limitações, é inegável que os povos indígenas tem no Ministério Público Federal um importante aliado em suas lutas pelos direitos constitucionais.
Projeto polêmico, abominado pelos Suruí
A maior parte do tempo do encontro no MPF girou em torno do polêmico projeto Carbono Florestal Suruí, iniciado em 2007. É considerado o primeiro do gênero implantado em terra indígena em nosso país. E na opinião dos Suruí e da delegação dos povos indígenas de Rondônia, deveria ser o último. É pelo menos nessa perspectiva que estão lutando, para que semelhante enganação não se repita em nenhuma terra indígena. O cacique geral do Povo Suruí, Henrique Iabaday, presente na delegação, em entrevista ao Porantim de setembro do ano passado, assim se expressou a respeito do projeto: “Projeto de carbono para nossa terra é para tirar a vida do povo Suruí, vai tirar a sua vida de felicidade, de direito de viver em cima de sua terra... É uma bomba pra vida de qualquer ser humano... O que aconteceu com o povo Suruí é uma história pro resto da vida e para o mundo... Para que nenhum indígena faça este tipo de projeto em sua terra... Não tem pra quem falar o que aconteceu com o povo Suruí. O povo tá sem vida. Queremos a supressão do projeto”.

Após alguns depoimentos de caciques Suruí, Dra. Deborah Duprat ponderou: “Quero ser muito honesto com vocês. Temos um problema muito sério com o projeto de sequestro de carbono Suruí. A 6ª Câmara aconselhou que não aceitassem o projeto. O contrato foi assinado e, portanto, continua válido. Pelo funcionamento da Justiça será preciso provar que não está sendo cumprido o que foi pactuado. Posso garantir a vocês que o MPF irá se empenhar para que haja uma rigorosa e profunda avaliação do projeto e suas consequências em termos de violência gerada, conflitos graves que podem levar a mortes e apropriações indébitas dos recursos, e a quem beneficiam. Vou solicitar a Funai que ela  proceda a um levantamento detalhado para embasar futuras decisões. Será preciso analisar e discutir com todas as comunidades os termos do contrato. Vamos investigar, e vocês façam a parte de vocês”. E ainda deixou bem claro: “O ministério público não fará nenhuma ingerência na questão interna do povo, pois quem melhor pode impedir esse projeto são vocês”.
Ficou evidenciado, após mais de duas horas de debates e esclarecimentos que as consequências perversas desse tipo de projeto devem servir como aprendizado e alerta para que não aconteçam com outros povos indígenas. O importante é enxergar esse tipo de projeto como parte de uma política do capitalismo verde e neocolonialismo. O Cimi, em nota de fevereiro de 2012, denunciou veementemente a insistência de implantação de projetos de REDD nos territórios indígenas, a partir dos direitos e da visão desses povos “esses projetos transformam a natureza em mercadoria, a gratuidade em obrigação, a mística em clausula contratual o bem estar em supostos ‘benefícios do capital’. É a mercantilização do sagrado e a coisificação das relações humanas em interface com o meio ambiente” por isso “quer juntar-se aos demais setores organizados que dizem NÃO à financeirização da natureza, NÃO à economia verde e NÃO ao mercado de carbono” (Porantim, setembro de 2014).
No documento entregue ao Ministério Público federal ressaltam as preocupações e fazem seu apelo:
“Nossa preocupação é dobrada quanto aos projetos de REDD (captura de gás carbono), que vem ameaçando a existência dos povos indígenas, em especial o povo Suruí, que já se encontra com projeto implementado, autorizado pela FUNAI, em parceria com a ONG Canindé que articula o projeto em terras indígenas, o IDESAN, que faz o levantamento do carbono, o ECAN, e a Forest Trand - organização norte-americana; Esses projetos ameaçam a vida e a existência dos povos que ficam impossibilitados de realizar a produção agrícola, a coleta de mel, a caça, a pesca, bem como a reprodução cultural. Esse projeto já em andamento no território Suruí e tem provocado uma divisão e uma fatal destruição da organização social do povo, acarretando inclusive riscos de violência entre os povos;
No território do povo Cinta Larga também está em curso a implementação do Projeto, já aprovado, para captura de gás carbono;
Exigimos urgentemente a suspensão e posterior cancelamento do Projeto de captura de Gás Carbono no território indígena Suruí e Cinta Larga e o impedimento de implementação de qualquer projeto que visa esse tipo de exploração em todos os territórios indígenas no estado de Rondônia e no Brasil;
Enfatizamos a responsabilidade da FUNAI pela implementação do Projeto Carbono no território Suruí, mesmo não havendo legislação que prevê tal iniciativa;
A guerra da terra e da saúde
A grave situação das terras, seja através das invasões dos grandes projetos e variados interesses econômicos, bem como a paralização dos processos de reconhecimento das terras indígenas, aliado a iniciativas contra os direitos indígenas na Constituição, como a PEC 2015, isso tudo é um decreto de guerra contra os povos indígenas, por parte do Estado brasileiro.
Com relação às paralisações, Dra. Deborah salientou que o Ministério público pressionou a Funai a dar passos com relação aos procedimentos demarcatórios em curso e que estavam pensando em termos de ajustamento de conduta para cobrar a continuidade dos processos. Quanto à PEC 2015 informou já terem sido tomadas medidas quanto à inconstitucionalidade da mesma.
No documento entregue à coordenadora da 6ª Câmara ressaltam: “Outro grande problema enfrentado por nós, povos indígenas de Rondônia e Mato Grosso, é o uso de agrotóxico no entorno de nossos territórios, que vem afetando gravemente a saúde do nosso povo, além de comprometer a nossa biodiversidade, reduzindo os peixes dos nossos rios, as caças de nossas florestas, e de contaminar a água que consumimos”.
Quanto à saúde denunciam a total desassistência e expressam sua posição contrária à criação da INSI (Instituto Nacional de Saúde Indígena.). Dra. Deborah acrescentou: “Se a saúde indígena está ruim, vai ficar pior”.
Egon Heck -Cimi Secretariado

Brasília, 24 de fevereiro de 2015

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

O GRITO DA SELVA AO PLANALTO Povos Indígenas de Rondônia em Brasília


Conforme verberaram os representantes dos índios Kayapó, em sua audiência com o  presidente da Câmara dos deputados, Eduardo Cunha, caso insistissem na aprovação da PEC 2015, semanalmente estariam em Brasília delegações indígenas  das diversas regiões do país.

Nesta semana estão fazendo ouvir o seu grito contra essa PEC e todas as iniciativas anti-indígenas tramitando no Congresso, no poder Executivo e no Judiciário, os povos indígenas de Rondonia. São muitos os problemas e desafios contra os quais estão lutando.  Porém a “questão que envolve tudo é a terra, a demarcação e proteção”, afirma Antenor Karitiana.

Durante essa semana terão audiências e contatos com diversos órgãos e instituições dos três  poderes. Será o grito dos povos:  Surui, Cinta Larga, Arara, Puruburá, Wajoro, Karitiana, Guarasugue,  Oro Waram Xijein, Oro Mon, Oro Waram.

Conforme Antenor Karitiana, que está lutando pelos direitos de seu povo e dos povos indígenas desde o período da constituinte, na década de 80, “Já lutamos muito. Enfrentamos inimigos perigosos. Fomos aos poucos construindo nosso movimento e organização. Vimos que o inimigo nosso está muitas vezes dentro do governo. Os que deviam proteger nossos direitos são os que tentam impedir a demarcação de nossas terras. Estão fazendo o jogo do fazendeiro. Hoje temos novas lutas contra as PECs, contra os projetos de REDD, captura de carbono, que vem ameaçando o território Surui, provocando conflitos internos. Mas nós vamos falar duro na defesa dos nossos direitos e denunciar o que ameaça nossos povos.”

Karitiana ainda  ressaltou a importância desse momento que está tendo  uma grande participação dos jovens e das mulheres. “Olha aí esse é meu filho e aquele é filho de Eva Kanoé e Piau, lá de Sagarana”. Os conheci quando ainda eram crianças, em 1972 quando com eles trabalhei algum tempo.

No inicio de abril vamos fazer uma grande Assembleia dos povos indígenas de Rondônia. Vamos fazer ouvir o nosso grito e cobrar do governo nossos direitos.

Terra, o problema número um.

Dentre os principais problemas ressaltam a paralização do processo de demarcação das terras dos povos Cujubim, Miguelem, Wajoro, Puruborá, Cassupá, Karitiana, Kaxarari, além da desintrusão da Terra Indígena Rio Negro Ocaia.
É grave a situação de invasão dos territórios indígenas em Rondônia, por madeireiros,  grandes empreendimentos, Pequena s Centrais Hidrelétricas.
Outro grande problema que enfrentam os “povos resistentes” (emergentes, ressurgidos) de Rondônia é a morosidade no reconhecimento étnico do povo Guarasugwe e Chiquitano e documentação dos povos : Cujubim, Miguelem, Warojo, Puruburá e Cassupá. Eles vem cobrar do governo, através do Ministério da Justiça e Funai, agilidade nesses processos e a garantia dos direitos coletivos, especialmente à terra.

Vítimas da borracha, dos garimpos  dos madeireiros e da colonização

A partir da década de 60 e principalmente de 70 houve a invasão massiva dos territórios  indígenas da região por projetos de colonização, pela expansão da frente agropecuária  e dos garimpeiros.  O grande estímulo a essas invasões se deu a partir da construção da rodovia BR 364, que cortou as terras de vários povos e forçou a rápida e irresponsável “pacificação” de vários povos. Basta lembrar a terrível chacina do povo Cinta Larga, do paralelo 11, a mortandade dos Pakaa Nova – Oro Wari, da região de Guajará a Mirim. Um relato da época menciona que no início da década de 60 a contatação precipitada com esse povo, fez com que de uma estimativa de 3 mil indígenas, após alguns anos estavam reduzidos a menos de 500 pessoas. (Folha do Acre 17/07/1963) “Confirmando  reportagens por nós divulgadas, a fome, a doença e aventureiros inescrupulosos estão dizimando os índios Pacaás Novos, que habitam as selvas de Rondônia. De um grupo de 400 selvícolas restam apenas 91 em estado precário. Essas foram informações prestadas à imprensa pele Dr. Noel Nutels (Alto Madeira, Porto Velho, 16-03-1962)

Poderíamos elencar inúmeros casos de violência e extermínio dos povos indígenas de Rondônia. Mas eles sobreviveram a todas as formas de violência, e hoje estão aí em Brasília, trazendo seu grito da selva e do massacre aos responsáveis pelo do Estado brasileiro.

Egon Heck
Cimi, Secretariado

Brasília 23 de fevereiro de 2025

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Declaração de guerra aos povos indígenas do Brasil




“Quando estão desarquivando a PEC 215 estão declarando guerra aos povos indígenas do Brasil. Vamos mostrar que estamos prontos para a guerra”.  Essa declaração feita por um dos caciques Kayapó na audiência com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, calou fundo no coração e sentimentos de todos os que estavam sentados na sala da Presidência. Tudo que acontecer daqui pra frente, não o será por falta de aviso.


Acabar com a PEC 215
“Acabar com a PEC 215, é isso que estamos pedindo. Cada vez mais o governo está sendo inimigo dos povos indígenas”. Disse em alto e bom tom, na língua Kayapó, um dos cinco caciques participantes da audiência. E arrematou: “Estão querendo acabar com a gente. Mas isso não vamos deixar”. O recado foi claro e contundente: em 2015 nada de PEC 215.
Um batalhão de representantes da imprensa apenas pôde registrar o cenário por breves segundos.  Eduardo Cunha, que depois tentou explicar sua posição, não poderá dizer que não foi avisado. Caso houver insistência na aprovação do projeto de emenda constitucional, “semanalmente estarão delegações dos índios de todo o país para impedir que isso aconteça”, afirmou outro cacique. Esta afirmação foi endossada por parlamentares presentes, como Sarney Filho que afirmou que “a correlação de forças é injusta. Caso houver insistência na aprovação dessa PEC, que não deveria existir, semanalmente teremos delegações indígenas aqui para chamar atenção para essa fratura exposta”.

O cacique Mekren, verberou com gestos incisivos: “Peço, por favor, acabar com esse projeto que vocês estão desengavetando. Peço para acabar com isso”. Outro cacique complementou: “Não é nós que estamos caçando briga com vocês. É vocês que estão caçando briga com nós. Deveria ter o mínimo respeito com nós, porque você fez acordo com os ruralistas...”.
O deputado Chico Alencar lembrou que os índios estão fazendo a leitura de que a Constituição foi como um contrato histórico que querem quebrar com essa PEC. “Eles não aceitam esse ataque. Aliás, essa PEC não deveria existir. Nós estamos declarando guerra a eles. Vamos evitar o genocídio”.

Disse que não fez
Em pouco mais de 20 minutos os Kayapó não deixaram dúvidas quanto à sua disposição de continuar lutando contra a referida PEC. No terceiro dia de trabalho da nova legislatura, os índios deram seu recado. O novo presidente da Câmara, que no último dia de janeiro se filiou à frente ruralista, tentou explicar sua posição enquanto presidente da Câmara. “Não tenho condições de barrar essa PEC e a formação de uma nova Comissão. É uma questão regimental. É só algum deputado pedir o desarquivamento e ela passará a tramitar conforme determina o regimento interno da Casa”. Em tom de desabafo: “Não fui eu que fiz essa PEC, que criou a Comissão. Só cumpro o regimento. Não tenho poder de acabar com essa PEC, não tenho competência para não desarquivá-la”. Afirmou ainda que não fez acordo com os ruralistas.
Dessa forma disfarçou o fato de que o desarquivamento já havia sido solicitado dia 3 deste mês. Os parlamentares solidários com a causa e direitos indígenas insistiram com o presidente da Câmara para que o tema seja melhor discutido com a sociedade e que não haja açodamento nos encaminhamentos dessa PEC, que se façam encontros com os ruralistas no sentido de encontrar alternativas , como a indenização dos títulos de propriedades de boa fé. Outro parlamentar ressaltou que está se fazendo uma espécie de terrorismo entre os ruralistas afirmando estar se criando terras indígenas aleatoriamente. O que não é verdade. Esse risco não existe.
No final, Eduardo Cunha concluiu dizendo se empenhar para a construção de diálogos e consensos. E deixou seu recado: “Vocês devem fazer isso civilizadamente”.

Lutas heroicas dos Kayapó pelos direitos indígenas

Lembro do momento histórico em que os Kayapó pediram que o Cimi os ajudasse apenas com hospedagem, que eles viriam a Brasilia para se unir aos demais povos indígenas na luta pelos direitos na Constituinte. Foram momentos inesquecíveis em que não houve guardas que os barrassem para exigir os direitos em qualquer espaço do Congresso. Isso nos idos tempos de 1987 e 1988. Passados mais de 25 anos e aqui estão eles novamente. Desta vez, quando se imaginava que os direitos estivessem sendo respeitados e colocados em prática, eles retornam ao cenário da luta, para evitar que haja retrocesso ou mesmo perda de direitos constitucionais.
É lamentável que o Brasil, após aprovar uma das constituições mais avançadas à época, com relação aos direitos indígenas, em especial, se encontre na deplorável situação de querer excluir ao invés de cumprir esses direitos.
Como no início do século XIX, na interpretação dos povos indígenas, está em curso nova declaração de guerra aos povos indígenas do Brasil.

Egon Heck
Cimi secretariado
Brasília, 5 de fevereiro de 2015

Kayapó vem a Brasília exigir seus direitos



Uma delegação de mais de 50 indígenas Kayapó  das Terras Indígenas Mekragnotire e Baú, do sul do Pará, município de Bom Progresso está em Brasília para cobrar das autoridades seus direitos constitucionais e as promessas feitas e não cumpridas.
Quando chegaram em frente ao Congresso não demoraram a chegar os primeiros interlocutores, os policiais. Logo um ar de nervosismo se espalhou pelos espaços do poder, ainda sob o impacto das reações de dezembro do ano passado, quando conseguiram evitar a aprovação do relatório da Comissão especial da PEC 215.
Astutamente conduziram os indígenas até uma sombra distante da portaria de entrada do anexo 2, com a promessa de que iriam ver a questão da conversa que os Kayapó estavam solicitando com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. A ele queriam perguntar as razões e consequências de suas declarações com relação ao apoio aos ruralistas, em detrimento dos direitos indígenas. “Queremos ouvir sua palavra”, afirma os indígenas em documento que gostariam de ter entregue ontem ao deputado Eduardo Cunha. Após mais de duas horas de espera, enquanto acontecia a reunião dos líderes dos partidos na Câmara, finalmente uma informação transmitida pelo deputado aliado da causa indígena, Chico Alencar “O presidente está muito atarefado, mas vai receber uma delegação de 5 lideranças amanhã às 15 horas.
Cobrando promessas exigindo direitos
A agenda da delegação é ampla. “os brancos não cumprem as leis que eles mesmos criam...Vamos brigar apelos nossos direitos até o fim”, manifestaram por ocasião do fechamento da BR 163, em anos passados. Esse histórico de luta dos Kayapó ficou nacionalmente conhecido, especialmente por ocasião da Constituinte, em 1988 quando estiveram frequentemente em Brasilia lutando ao lado dos demais povos indígenas do país. Na década de 80 para cá enfrentaram muita pressões e invasão de seu território, principalmente de parte de madeireiros e, fazendeiros e garimpeiros.
Na agenda dos encontros desejados consta uma  conversa com a presidente da República, Ministro da Justiça, Ministros do Meio Ambiente e Transporte, além da Procuradoria Geral da República.
Além disso irão questionar a construção de PCHs(hidrelétricas de pequeno porte) em seu território. Também querem saber a posição dos diversos órgãos e as ações com relação à Hidrelétrica de Belo Monte. Os Kayapó tem se manifestado criticamente e contrários à obra, desde o primeiro grande encontro contra a obra, em 1989.
Recebidos pela polícia
Uma questão de causa estranheza é o grande aumento de seguranças contratadas na legislatura anterior e o fato da segurança estar encarregada de fazer a interlocução com as delegações indígenas. Comentava o assessor de um dos partidos, que é inacreditável que a Câmara não tenha pessoas que façam essa interlocução  política, uma vez que não se trata de relação com povos  que em nada representam ameaças aos poderes constitucionais. É hora da presidência da Câmara instituir uma comissão para tratar com as lideranças indígenas,  pois essa não é função dos seguranças da casa.
Barrados na entrada da Câmara
Suspense e agitação se espalhou rapidamente com a presença dos índios. Enquanto os indígenas aguardavam resposta da audiência com o novo presidente da Câmara, o secretário e ex-secretário do Cimi, foram barrados na entrada do anexo 2. Sem justificativa e de forma arbitrária, a segurança da “casa do povo”  simplesmente se restringiu dizendo estar cumprindo ordens.” É absurdo e inaceitável que esse tipo de arbitrariedade continue existindo, impedindo cidadãos desse país a estar num espaço que a Constituição lhes garante.”, comentou o secretário do Cimi, enquanto aguardava que o presidente do partido, com o qual iriam ter reunião, conseguisse liberar a entrada. Infelizmente parece que os movimentos sociais terão cada vez mais dificuldade de acesso aos espaços do diálogo e do poder.

Egon Heck
Secretariado nacional do Cimi
Brasilia, 4 de fevereiro de 2014

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Munduruku abrem o ano de luta em Brasília

Munduruku abrem o ano de luta em Brasília
I
Depois de quatro ou cinco dias de ônibus e voadeira, uma delegação de 30 lideranças do povo Munduruku, chegou a Brasília nessa quarta-feira (28), com pés inchados, corpo dolorido e muita disposição para lutar pelos direitos de seu povo e de todos os povos indígenas no Brasil.
Querem conversar com o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) e com o ministro Miguel Rossetto, da Secretaria Geral da Presidência da República, exigindo uma resposta concreta com relação a seus direitos básicos, às terras, aos recursos hídricos e tudo que pretende ameaçar seus direitos, sua autonomia e seus recursos naturais.
Querem saber o que efetivamente o governo irá fazer para impedir retrocessos como a aprovação da PEC 215, o PL 1610 e outros tantos projetos ameaçadores à vida dos povos originários deste país. Essas e outras questões mais específicas relacionadas à construção de hidrelétricas em território Munduruku, no médio e alto Tapajós.
O governo precisa nos ouvir
Dentre os vários assuntos que irão debater e obter respostas e compromissos está a questão da relação do Estado Brasileiro com o povo Munduruku. Questionam a forma autoritária e má fé com que o governo diz ter consultado o povo para a construção de hidrelétricas, especialmente a de São Luiz do Tapajós, forjando posicionamentos favoráveis e dividindo o povo. Em função dessa atitude política maldosa e perversa,  os Munduruku se reuniram por diversas vezes no ano passado, e em dezembro aprovaram o “Protocolo de Consulta Munduruku”.
No documento, exigem do governo a demarcação da Terra Indígena Sawré Muybu, antes de iniciar a consulta prévia sobre os empreendimentos hidrelétricos “sabemos que o relatório está pronto e que a demarcação não ocorre por conta da hidrelétrica.” E demonstrando firmeza, clareza e estratégia política, exigem que os outros povos indígenas e os ribeirinhos também sejam ouvidos, de modo adequado e específico  à  realidade deles.
Colocam com muita clareza que devem ser ouvidos amplamente as 130 aldeias, os caciques, os guerreiros e guerreiros. Devem ainda ser consultadas as mulheres (que são pajés, parteiras e artesãs), os professores e agentes de saúde. “As decisões do povo Munduruku são coletivas”.
Colocam suas exigências sobre como deve ser o processo de consulta: “O governo não pode nos consultar apenas quando já tiver tomado uma decisão. A consulta deve ser antes de tudo”. E descrevem como querem que sejam as consultas “Eles têm que viver com a gente, comer o que a gente come. Eles têm que ouvir a nossa conversa. O governo não precisa ter medo de nós. Se ele quer propor algo que vai afetar nossas vidas, que ele venha até nossa casa. Não aceitaremos conversar com assessores, queremos ser consultados por quem tem poder de decisão”. A isso acrescem que as reuniões devem ser feitas em seu território, na língua Munduruku e coordenadas pelos líderes de seu povo. Descrevem como devem ser as reuniões. “Reunião para fazer acordo sobre o plano de consulta. Reunião informativa, quando o governo deve reunir o nosso povo de aldeia em aldeia. Reuniões internas, necessárias para discutir entre nós a proposta do governo, com tantas reuniões quantas forem necessárias para que o povo Munduruku possa informar-se completamente. Reunião de negociação, quando tivermos discutido com o nosso povo e tivermos uma resposta a dar ao governo”.
Terminam o documento dizendo que “nossa decisão deve ser coletiva... nós esperamos que o governo aceite nossa decisão. Nós temos poder de veto, Sawe”
Educação e saúde como nós queremos
Em debate na Funai nesta quinta-feira (29), ressaltaram que não abrem mão de ter uma escola diferenciada conforme a vontade do povo. Que as escolas profissionalizantes, de nível médio, funcionem efetivamente e que as atividades se dêem nas aldeias, e não nas cidades da região.
Na discussão sobre uma possível Universidade Intercultural do Tapajós, foi sugerido o intercâmbio com experiências nessa perspectiva já em curso no país e a criação de um Instituto que viabilize um processo nas perspectivas desejadas.
Quanto aos diversos problemas e desafios que enfrentam no dia a dia nas aldeias foram sugeridos alguns encaminhamentos.

Egon Heck
Cimi Secretariado
Brasília, 29 de janeiro de 2015