ATL 2017

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domingo, 3 de agosto de 2014

A Ilhado Bananal e seus povos


Ao atravessar a ilha nos deparamos com paisagens encantadores e muitas dores impostas a seus originários moradores, os Karajá e Javaé e mais recentemente os Avá Canoeiros que para lá foram levados, em função das invasões promovidas pelos diversos interesses econômicos, dentre os quais a pecuária e o turismo.

Idjahina Karaja/ Jawaé, sábio, líder e nosso mestre nos guiou com segurança e prudência  na travessia dos brejões e igarapés. Longos silêncios meditativos vão se intercalando com os ruídos  de multidões de animais e aves.  Estamos envoltos nas energias desse pedaço do  Brasil recôndito, que precisa de respeito e apoio para que sua terra sagrada não seja respeitada e seus povos  e todas as formas de vida sobrevivam com abundância, liberdade e beleza.
Nas aldeias de Txuiri e Santa Izabel,  encontramos muita esperança, vida, crianças lindas e alegres. Os dias que partilhamos com as comunidades foram de imensa riqueza na troca solidária de saberes e esperança. Uma resistência secular impressionante. “O fato de  conservarem sua língua já lhes garante 50% da sua sobrevivência física e cultural”, afirmou D. Pedro. Apesar de todos os projetos  impactantes que foram levados para a ilha, eles conseguem driblar as ameaças e continuarem  afirmando e fortalecendo suas vidas e cultura.
Também pudemos sentir os muitos riscos e desafios que enfrentam no dia a dia, em grande parte decorrentes da ausência de políticas públicas respeitosas e eficazes.
Exímios artesões
O povo Kajará é conhecido nacionalmente pela beleza e destreza  artística, com a produção  de artesanato de primeira qualidade. Vão a São Felix do Araguaia, parte de seu território original, vender seu artesanato e adquirir  os produtos de maior necessidade hoje em dia. Seguem também Brasil afora com essa atividade.

Além de  terem fortemente impactado seu regime alimentar,  dependências e vícios acabem tende forte impacto sobre o equilíbrio e vivência harmônica nas aldeias e no conjunto da vida na ilha, na terra e nas águas. Esses desafios são enfrentados pelas aldeias com muita determinação e esperança. Porém nem sempre é fácil superá-los.
Os povos da ilha do Bananal com toda a rica diversidade de vida precisa ser respeitada e apoiada, conforme nos conclamou Dom Pedro Calsaldáliga “Assumam a causa indígena...a levem para dentro da universidade...”
Somos imensamente gratos aos Javé e Karaja, por terem partilhado parte de suas lutas e vidas conosco
Os isolados e a saudação de vida e morte
Essa semana mais uma vez o Brasil e o mundo assistiram o contato de um gruo de índios isolados (também denominados de livres), no Estado do Acre.  A primeira questão importante é nos darmos conta de que no Brasil existem pelos menos 90 grupos que estão evitando o contato com a sociedade não indígena, possivelmente por já terem sido vítimas de violências e mortes. A maioria desses grupos, numericamente muito reduzidos, se refugiam nos últimos espaços ainda não invadidos pelas frentes de expansão na Amazônia.  Os riscos de serem atingidos, rechaçados, caçados ou contaminados por madeireiros, garimpeiros, peões ou jagunços são grandes. Também correm o risco do abraço oficial, igualmente mortal, uma vez que o mesmo governo que mantém as “frentes de atração”, é o mesmo que implantou os projetos fatais do PIN (Plano de Integração Nacional), no início da década de 70 e se atualiza com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) , e seus grande projetos. É  o contraditório processo de defender os índios sem “atrapalhar o progresso”, inerente  ao acelerado avanço capitalismo sobre os recursos naturais da Amazônia.
Basta lembrar os processos genocidas que foram impostos a esses povos pelas transferências forçadas em função da construção de estradas, hidrelétricas e outras obras, que levaram à morte milhares de indígenas nas últimas décadas, como os Waimiri/Atroari, os Parakanã, os Yanomami, os Panará, os Kayabi,  os Txukaramãe, Tenharim, os Arara e dezenas de outros povos, particularmente na Amazônia. Seria, como afirmou Orlando Vilas Boas, na década de 70, “Um abrraço de morte?” Será que a manifesta boa intenção da presidente da Funai conseguirá  garantir a vida de mais um dos “povos em situação de isolamento voluntário”?
Com Leonardo Boff acreditamos e esperançamos que “Muitos veem, como o (sociólogo português) Boaventura de Sousa Santos, que na América Latina há um conjunto de valores vividos pelas culturas originárias que podem ajudar a humanidade a sair da crise. Especialmente com a característica central do bem-viver, que significa ter outra relação com a natureza, entender a Terra como mãe, que nos dá tudo que precisamos ou podemos completar com o trabalho”.(Entrevista a S 21)

Egon Heck
Secretariado nacional do Cimi

Brasilia, 2 de agosto de 20014