ATL 2017

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terça-feira, 29 de outubro de 2013

Brasil denunciado


 
A violação dos direitos das populações indígenas e tradicionais está sendo mais uma vez denunciado em  fórum internacional. Desta vez a denúncia é  pelas ameaças e violências constantes contra o povo Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul, em especial da aldeia de Guaiviry  e a comunidade quilombola de  Brejo dos Crioulos, em Minas Gerais. Representantes dessa duas comunidades estarão prestando depoimento hoje na sede da Organização dos Estados Americanos - OEA, na Comissão de Direitos Humanos.

Em suas grandes assembleias - Aty Guasu - os Kaiowá Guarani tem afirmado repetidas vezes de que, diante da omissão ou ineficácia do Estado brasileiro em respeitar e tornar realidade os direitos humanos e constitucionais de seu povo lhes restavam apenas dois caminhos: a denúncia internacional e o retorno a seus territórios tradicionais.

Os quilombolas, que são mais de 5 mil comunidades em todo país, sofrem o mesmo processo. A quase total paralisação dos seus territórios é fator de crescentes violências contra esses povos e aumento das ameaças de morte. Além disso seus direitos à terra são ameaçados  por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADIN, nº 4887/2003. A luta contra a PEC 215 e outras vem unificando cada vez mais povos indígenas, quilombolas,ambientalistas e outros setores de luta na terra.

Desde Juruna

Desde a década de 80, quando o Brasil foi denunciado pela prática de genocídio e etnocídio, no IV Tribunal Russel, em Roterdam, Holanda, vem sendo levado a tribunais e instâncias Internacionais, como ONU - Organização das Nações Unidas e OEA - Organização dos Estados Americanos, pela violação dos direitos humanos, particularmente das populações tradicionais e povos indígenas.

Foram levados ao julgamento 5 situações de grave violação de direitos indígenas no Brasil Rio Negro (AM). A acusação foi feita pelo escritor Marcio Souza; Kaingang e Guarani de Mangueirinha -  Acusação apresentada pelo Cimi- Sul - roubo das terras, etnocídio e roubo dos meios de existência dos povos Kaingang e Guarani; Nambiquara - Comissão de Defesa do Povo Nambiquara - etnocídio e Genocídio deliberado causado pela construção de uma estrada através do território indígena; Waimiri-Atroari - Acusação feito por Egydio Schwade - genocídio; construção de uma estrada e um projeto hidrelétrico em território indígena Yanomami - acusação feita por ARC/CCPY - território Indígena transformado em Parque de Reserva Nacional e assim explorado economicamente sem restrições.

Nos casos denunciados o Brasil foi acusado de etnocídio e genocídio, por ter violado, a Constituição do país, A lei 6001-Estatuto do Índio, o Convênio sobre a Prevenção e sanção do Crime de Genocídio, o Convênio concernente `Proteção e Integração dos Indígenas e outras populações tribais e semi tribais em Países Independentes.

A pergunta que fica é porque mais de três décadas depois dessa denúncia o Estado brasileiro ainda não  superou a principal causa das violências e violações dos direitos humanos e étnicos desses povos, ou seja, regularizou e protegeu suas terras.  Infelizmente, ao invés de reconhecer esse direito sagrado e fundamental, as iniciativas em curso vão no sentido contrário, ou seja, retirar os direitos da Constituição ou criar ainda mais empecilhos  para cumprir  a lei.

 

Egon Heck

Povo Guarani, Grande Povo

Cimi, Brasília, 29 de outubro de 2013

 

 

 

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Direitos indígenas sem condicionantes



Plenária do Supremo Tribunal Federal lotado. Um bom grupo teve que se limitar acompanhar a votação dos embargos declaratórios relacionados à Terra Indígena Raposa Serra do Sol, na sombra do suprema. "Mesmo sem poder entrar com nossos instrumentos rituais, nós Kaiowá Guarani e todos os povos indígenas, estamos armados com o que nos resta: muita esperança e a força dos nossas antepassados e nossos deuses. Nossas vidas  e direitos não vão ser rasgados e pisados", afirmou uma das lideranças indígenas.
Ás 18,30 foi encerrada a 28ª sessão ordinária daquele egrégio poder.  Alívio. Os povos indígenas puderam respirar, com a esperança oxigenada, recobrando forças para os próximos embates. A tirania do agronegócio e do latifúndio, não conseguiu seus intentos anti-indígenas. Os Kaiowá Guarani que permaneceram no plenário por três horas, receberam a decisão do Supremo no retorno para suas aldeias e acampamentos. Vibração. Apesar de não ser uma vitória total, afastou os fantasmas da temporalidade e outros que visavam retirar seus direitos, especialmente  às terras. A luta continua, no chão do retorno a seus territórios originários e na desintrusão das terras já demarcadas.
Os povos indígenas esperam que o governo finalmente rasgue e enterre a portaria 303 e acelere a demarcação, desintrusão e garantia das terras-territórios indígenas. Ao invés de se dobrar  às exigências dos  interesses anti indígenas, alterando as normas do processo de regularização das terras indígenas, tumultuando ou até inviabilizando as demarcações. Agilize a execução de suas obrigações constitucionais.
Novos  guerreiros
Os jovens e adolescentes  Kaiowá Guarani,  expuseram suas indignações, revoltas, anseios e exigências a representantes de vários ministério, parlamentares, ministros e de órgãos governamentais. "estamos cansados de promessas e de entregar documentos. Queremos soluções. Não aguentamos mais".   Sentiram-se discriminados várias vezes por não permitirem que entrassem nos espaços do poder, com seus instrumentos rituais. "Sentimos a discriminação e preconceitos. Vamos levar isso para nossas aldeias. Nós sempre recebemos bem todo mundo e nunca  colocamos condições para entrar nas nossas casas", desabafou um jovem. Kaiowá.
No documento entregue ao ministro Gilberto Carvalho  afirmas " A situação em que nosso povo está  é uma vergonha para um país como o Brasil,  que busca se destacar como uma potencia mundial. Diversas entidades internacionais já chamaram atenção: o governo brasileiro não está sendo verdadeiro quando diz que os direitos indígenas, em nosso país, são respeitados...Pedimos também ao governo federal que dote posição efetiva quanto ao problema da impunidade em relação às mortes dos nossos parentes assassinados em conflitos de terra. A memória dos nossos heróis Jenivaldo e Rolindo Vera, Nisio /gomes, Xurite Lopes, Denilson Barbosa e tantos outros, clama por  justiça."
Yvy Katu - A terra sagrada  de volta
Neste mês de outubro os Kaiowá Guarani  deYvy Katu estão em mobilização de retorno às suas terras originárias, já demarcadas, mas ainda ocupadas por fazendeiros. Em carta às autoridades expressam sua decisão "A partir desse momento os Guarani voltaram para retomar e ficar definitivamente em sua terra tradicional, porque estamos cansados de esperar da justiça brasileira, vamos fazer nosso jeito de ocupar e usar  a terra que sempre foi nossa" (Carta manuscrita - comunidade de Yvy Katu).
A tensão é grande depois que os fazendeiros contrataram a empresa de pistolagem - GASPEM, para fazer a segurança na região. Os índios temem que  a qualquer momento possam ser atacados a tiros com violência e mortes.
Egon Heck
Povo Guarani Grande Povo
Cimi - Brasília 24 de outubro de 2013
 
 

domingo, 20 de outubro de 2013

Kaiowá Guarani em Brasília - Formando guerreiros

Mais de 40 adolescentes, jovens e crianças Kaiowá Guarani estarão em Brasília neste inicio de semana. Não estarão vindo a passeio ou para matar as curiosidades com relação espaços do poder. Estarão trilhando o caminho de seus pais e lideranças na luta por seus direitos,  por terra e justiça.

Eles vem para o 1° Fórum de "Direitos e Cidadania na visão de crianças e adolescentes Guarani Kaiowá".  Eles vem de uma realidade sofrida, em alguns lugares desesperadora, sob os barracos de lona preta na beira das estradas e nas retomadas, submetidos a todo sorte de violência e discriminação. Como diz a coordenadora do evento, Dirce Carrion "No Mato Grosso do Sul, além da falta de assistência, é possível identificar situações de genocídio que pesam sobre os povos que vivem ali. Segundo dados do relatório “Violência contra os povos indígenas no Brasil” de 2011, o povo Guarani Kaiowá enfrenta  uma verdadeira guerra contra o agronegócio registrando uma taxa de homicídio de 100 por 100 mil pessoas (maior que a do Iraque). Em consequência existe um quadro  altíssimo de suicídios, especialmente entre  os jovens e adolescentes.

É sobre essas realidades que eles vem conversar com diversos representantes dos três poderes. Mas vem principalmente para dizer ao Brasil e ao mundo que seu povo e em especial os adolescentes e crianças não se aceitam esse grave quadro de injustiças e preconceitos a que estão submetidas suas comunidades,  famílias e povos. Exigem justiça, exigem as terras demarcadas e uma vida de paz e dignidade. Eles vem  das aldeias de Panambizinho, Tey Kue, Kurusu Ambá, Ipoy e Guaiviry .

 Fome de justiça

Na véspera da celebração dos 30 anos do assassinato de Marçal Tupã'y, eles vem pedir o fim da impunidade dos assassinos das lideranças de seu povo. Querem saber onde estão os corpos do professor Rolindo, do Ypo'i, do cacique  Nisio, de Guaiviry.

É neste espírito de formadores de guerreiros e guerreiros de seus direitos que eles estarão em Brasília. Eles vem  "expor suas demandas, seus anseios e suas exigências por direitos que sejam atendidos pelo poder público e respeitados pela população."


Eles vem da fome, exigem alimentação adequada, vem da impunidade, exigem justiça, vem da discriminação e racismo, exigem respeito e igualdade na diversidade, eles vem da negação da vida, da violência, exigem paz e direitos cumpridos.

Enquanto isso um jornal de Dourados veiculou nessa semana um comentário onde, com relação aos Kaiowá Guarani afirma "Em 1500, quando os portugueses aportaram no Brasil, existia um povo sem roupa mas com uma cultura riquíssima e hoje os índios estão vestidos, calçados, documentados, mas despidos de cultura." (O Progresso, 16/10/13). Só aos olhos segados pelo agronegócio e racismo, esse povo de resistência secular não "está despido de cultura". Talvez fosse mais correto dizer que estão despidos da cultura genocida e etnocida do colonizador.

Já no Senado . "Meia dúzia de índios e alguns vagabundos pintados conseguiram por meio de baderna impedir a criação da comissão para debater o tema", reclamou Moreira. A baderna a que ele se referia eram os protestos feitos em Brasília, no início do mês, por índios que exigiram de deputados que não transferissem para o Congresso as decisões sobre a demarcação atualmente a cargo da FUNAI. (Isto É - dinheiro, 13/10/13) "

Esses comentários mostram bem a mentalidade predominante, infelizmente, em amplos setores do Estado. Essas guerras, silenciosas ou alardeadas, nos dão ideia da dimensão e continuidade do extermínio e intolerância secular.

Está previsto para dia 23, quarta feira, do julgamento das condicionantes relacionadas à demarcação da Raposa Serra o Sol. Manifestemos aos Ministros do Supremo nossa esperança de que as condicionantes sejam rejeitadas e se inicie uma promissora caminhada, mesmo que tardia, de justiça e respeito aos direitos dos povos originários

Egon Heck

Povo Guarani, Grande Povo

Cimi Brasília, 19 de outubro de 2013

domingo, 13 de outubro de 2013

Julgamento das condicionantes no Supremo Tribunal Federal - Petição 3388



Os corpos pintados e as lindas e intensas cores trouxram esperança para os povos indígenas e para o país. Mulheres Xikrin em seus rituais em frente ao Congresso

Mal terminam os momentos de intensa mobilização indígena , num verdadeiro levante pela  vida, direitos e terras indígenas, numa cruzada em defesa da Constituição federal e denúncia das manobras em curso para suprimir direitos indígenas e demais populações tradicionais, numa  guerra contra esses povos, e se trava mais uma importante batalha por ocasião do julgamento das condicionantes, no STF. O julgamento está previsto para a semana que inicia.

Os ruralistas e o agronegócio querem e na prática já utilizam as condicionantes, que essas condicionantes estendam seus efeitos (funestos) a todos os povos indígenas do país.

Os povos indígenas da Raposa Serra do Sol, de Roraima e do país esperam uma decisão favorável do Supremo, para a manutenção de seus direitos constitucionais, a integridade de suas vidas e territórios.

É importante que a sociedade brasileira que tão prontamente apoiou os povos indígenas manifesta sua esperança de que as condicionantes não sejam aprovadas para que esses povos possam respirar com mais tranquilidade e a sociedade brasileira consolide mais um passo na efetivação dos direitos indígenas, que representam, antes de mais nada uma vitória da sociedade brasileira e do país.

Os povos indígenas da Raposa Serra do Sol irão fazer um documentário mostrando o " fim dos conflitos e recuperação da terra, sustentabilidade, projetos, parcerias, planos de gestão da terra, a questão da energia e os estudos". Desta forma acreditam retribuir a solidariedade recebida dos povos indígenas no país e auxiliar os ministros do Supremo em sua decisão sobre as condicionantes.

A sanha  ruralista

Num  artigo sobre as mobilizações indígenas de início de outubro, os professores da Luiz Henrique Gomes de Moura e Rafael Villas Bôas , da UNB apontam a estratégia dos ruralistas "Sua pauta ampliada, no entanto, demonstra de onde vem sua força. No início dos trabalhos da atual legislatura, Moreira Mendes, presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, fachada institucional dos ruralistas, deixou claro os objetivos desse mandato: destruir a legislação ambiental, com foco no Código Florestal, acabar com as Unidades de Conservação e as Terras Indígenas, flexibilizar as leis trabalhistas, liberar a compra de terras por estrangeiros e facilitar a liberação de transgênicos e agrotóxicos"

Eliane Brum explica que um dos principais focos da atuação da bancada é avançar sobre as terras públicas, fazendo com que se tornem disponíveis para ganhos privados. “Para isso, mira nas terras públicas destinadas aos povos indígenas, cujo direito originário a essas terras é reconhecido e assegurado pela Constituição de 1988    À pauta da Bancada Ruralista deve-se somar o atual Código da Mineração, que em sua redação atual atenta gravemente contra a soberania territorial dos povos do campo, das florestas e das águas. E, para além do legislativo, atendem a esse projeto de aprofundamento da acumulação capitalista no Brasil os megaprojetos planejados pelos PAC 1 e 2, como as grandes hidrelétricas, portos e campos de mineração." (UNB, outubro 2013)

Com certeza os ruralistas estarão com intensa mobilização nos estreitos corredores do poder buscando a aprovação das condicionantes. Em caso de derrota, estarão detonando seus pesados petardos já engatilhados.

Nascemos sob a égide do genocídio

Na abertura da Feira do Livro, em Frankfurt, Alemanha, um escritor brasileiro foi aplaudido de pé, ao discorrer sobre a história e realidade brasileira e sua utopia de transformação. Luiz Ruffato,  em sua fala afirmou "Nascemos sob a égide do genocídio. Dos quatro milhões de índios que existiam em 1500, restam hoje cerca de 900 mil, parte deles vivendo em condições miseráveis em assentamentos de beira de estrada ou até mesmo em favelas nas grandes cidades. Avoca-se sempre, como signo da tolerância nacional, a chamada democracia racial brasileira, mito corrente de que não teria havido dizimação, mas assimilação dos autóctones. Esse eufemismo, no entanto, serve apenas para acobertar um fato indiscutível: se nossa população é mestiça, deve-se ao cruzamento de homens europeus com mulheres indígenas ou africanas - ou seja, a assimilação se  através do estupro das nativas e negras pelos colonizadores brancos...  Em nossos tempos, de exacerbado apego ao narcisismo e extremado culto ao individualismo, aquele que nos é estranho, e que por isso deveria nos despertar o fascínio pelo reconhecimento mútuo, mais que nunca tem sido visto como o que nos ameaça. Voltamos as costas ao outro --seja ele o imigrante, o pobre, o negro, o indígena, a mulher, o homossexual" ( Frankfurt, 8/10/13)

Egon Heck

Cimi, Brasília 13 de outubro de 2013

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Respeitem a Constituição


Mobilização indígena nacional

 “Nos respeitem. Respeitem nossos direitos. Não continuem rasgando a Constituição.”  Uma semana de intensa mobilização dos povos indígenas que ocupam Brasília há quase uma semana. O enterro "simbólico" com rituais verdadeiros de proeminentes inimigos como  Kátia Abreu, Ronaldo Caiado, Gleise Hofmann e Luiz Adams,  e a ocupação da Confederação Nacional da Agricultura-CNA são demonstrações inequívocas de uma luta sem tréguas na defesa de seus direitos.
  
O chão tremeu com o pisar forte e ritmado dos cantos de guerra, e dos gritos repetidos de fora Katia Abreu. Após o susto inicial, os poucos funcionários se transformaram em plateia silenciosa e curiosa. Os indígenas permaneceram dentro da sede por mais de uma hora em rituais, demonstração de união, indignação e gritos. Sem vandalismo ou violência deram seu recado radical:
Fica uma pergunta sem resposta porque o presidente do congresso esvaziou a casa em plena semana de comemoração das bodas de prata da carta magma? Reza o ditado popular: Quem não deve, não teme. Então porque "fugiram" senhores parlamentares deixando o congresso vazio, desmarcando todas as sessões?. Afinal a sociedade pode constatar que  os povos indígenas apenas  lutam para que se compra a constituição, não são canibais,baderneiros ou cidadãos de segunda categoria. Pelo contrário, talvez tenham sido os brasileiros de raiz que mais defenderam a Constituição.
 



Na véspera da comemoração dos 25 anos da Constituição, os povos indígenas, expressaram sua indignação, exigências e esperanças: “repudiamos de público os ataques orquestrados pelo governo da presidente Dilma Roussef e parlamentares majoritariamente ruralistas do Congresso Nacional, contra nossos direitos originários e fundamentais, principalmente os direitos sagrados à terra,territórios e bens naturais garantidos pela Constituição Federal de 1988”. Reafirmam “Diante dessa realidade, de forma unânime, de uma só voz, declaramos e exigimos do Estado brasileiro, inclusive do poder judiciário, que respeite os nossos direitos, que valorize a diversidade e pluralidade da sociedade brasileira. Reafirmamos que vamos resistir, inclusive arriscando nossas vidas, contra quaisquer ameaças, medidas e planos que violem nossos direitos e busquem nos extinguir, por meio da invasão, destruição e ocupação de nossos territórios e bens naturais, para fins desenvolvimentistas e de interesse de uns poucos”.  Por fim exigem o arquivamento imediato e definitivo de todas as iniciativas que afrontam seus direitos e a retomada imediata da demarcação de todas as terras indígenas. ( declaração em defesa da Constituição Federal, dos Direitos Constitucionais indígenas, quilombolas de outras populações e da mãe natureza)

A volta vitoriosa

Brasília se enfeitou de verde para acolher os povos indígenas, no espaço da esplanada dos ministérios, que já se transformou em patrimônio de luta dos povos originários desse país, na luta pelos seus direitos.

Recado dado, é hora de voltar para as aldeias, onde a vida e luta continuam. Deixaram a capital federal satisfeitos com as mobilizações realizadas numa semana intensa, mas que não tirou o ânimo de quem veio para mais uma batalha por seus direitos ameaçados e desrespeitados. Vieram para defender e exigir respeito à Carta Magna do país, que eles ajudaram a construir há 25 anos e que em grande parte continua sendo desrespeitada por aqueles mesmos que deveriam ser os primeiros a cumpri-la. Mas também voltam preocupados, pois sentem a má vontade e malvadeza que acontece nos três poderes, ameaçando e violando os direitos indígenas.

Em suas bagagens levam, além das armas que sustentam suas esperanças, arcos, flechas, bordunas, inúmeras lembranças das mobilizações, registros das falas indignadas, dos momentos de tensão e repressão, das centenas de militares postados à sua frente para impedir que pudessem entrar na casa do povo. Levam também a certeza de que voltam às suas terras mais unidos e articulados e com um apoio muito maior da sociedade brasileira, que não apenas viu e vibrou com as manifestações, mas que vai também cobrar o respeito aos direitos e consolidação de um país Plurinacional, respeitador de sua gente raiz, originária.

Egon Heck e Laila Menezes
Povo Guarani Grande Povo
Brasilia, 6 de outubro de 2013


Repórter de uma guerra secular


 

Mobilização Indígena em Brasília

 

Em frente ao Congresso centenas de policiais estão apostos e dispostos a reagir a qualquer tentativa de entrada na “casa do povo”. Do outro lado da trincheira verde centenas de indígenas de todo o país decididos a visitar a sua casa e entregar um documento com suas exigências e reivindicações. Quando os indígenas se aproximam, recebem uma rajada de pray de pimenta nos olhos. Correm com a forte ardência dos olhos.Revoltados pelo ato covarde dos “recepcionistas” com suas armas modernas de uma guerra secular, insistem em sua intenção de entrar no Congresso, covardemente abandonado, com as atividades suspensas. Seguem-se momentos de tensão e expectativa. Os Kayapó e Xavantes fazem seus rituais de guerra e com seus arcos, flechas e bordunas avançam em direção aos policiais. Centenas de guerreiros de inúmeros povos se posicionam frente ao Congresso ao qual pretendiam entrar para  um ato de protesto, num diálogo impossível, de uma casa donde partem iniciativas mortais contra seus povos e diretos.

 
É apenas mais um capítulo de uma guerra secular. Mudam as armas e os atores, mas o processo de invasão, violência, saque e extermínio genocida continuam. Infelizmente, nessas últimas décadas, tenho sido mais uma espécie de repórter, testemunho e indignado registrador das violências que o projeto colonizador impetra contra os povos originários dessa terra.

 
A guerra se sofisticou.  Colocaram-se silenciadores nas armas pesadas, aprovadas na calada da noite, nas formas de projetos de lei, portarias, projetos de emendas constitucionais e  todo um arsenal de artilharia acionada contra os direitos constitucionais indígenas

 
Simbolicamente, na tarde desse dia 2 de outubro, Brasília se transformou no palco de mais uma batalha contra os direitos dos povos indígenas. Impedidos de entrar no Congresso, os indígenas manifestaram sua indignação fechando os acesso aos três poderes e circulando por esses espaços, fortemente ocupados por tropas policiais.

 Mulheres Pataxó, de Coroa Vermelha, revoltadas com a ação dos policiais que atiraram spray de pimenta em seus olhos,  chorando xingavam os responsáveis pela atualização da violência desses 513 anos, desde que Cabral iniciou a invasão de seu território.

 
Solidariedade e apoio

 
Foi um dia marcante para os mais de mil indígenas de uma centena de povos de todo o país. Foi o momento de deixar as cores da lona de circo e circular nos espaços dos três poderes, em lindos e coloridos rituais e indignadas manifestações e exigências.

 
Mas foi também um dia em que receberam importante solidariedade da Central Única dos Trabalhadores – CUT , “Declaramos todo apoio à semana de mobilização em defesa dos direitos indígenas, presentes na Constituição Federal...”. O  sindicato dos servidores públicos no distrito federal – SINDSEP-DF “vem a público apoiar a convocação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil para as manifestações em defesa dos direitos indígenas presentes na Constituição Federal de 1988...Nós enquanto representantes dos servidores públicos não podemos estar ausentes dessa luta, pois o que está em jogo é a soberania nacional”. Também receberam importante apoio da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, onde participaram de um debate e de uma centena de deputados aliados que vieram até o acampamento trazer seu apoio e solidariedade.

 
A mobilização e luta dos povos indígenas em todo o Brasil e particularmente em Brasília a cada dia que passam vem recebendo apoio da sociedade brasileira e internacional, “pois essa é uma luta pela vida dos povos, da natureza, do planeta terra”.

 

Egon Heck

Povo Guarani Grande Povo

Cimi, Brasília, 3 de outubro de 2013


A volta dos guerreiros - 25 anos depois da Constituinte


Quem imaginaria que 25 anos depois daquela  difícil mas gloriosa vitória dos povos indígenas e setores progressistas da sociedade,na Constituição com avanços significativos  e conquista de direitos sociais,  teríamos um quadro de mobilizações para impedir retrocessos. Sonhávamos com um cenário bem diferente:  os direitos conquistados consolidados, rumo à construção de uma sociedade mais justa, na pluralidade de seus povos e culturas,  democracia participativa e  comunitária,não apenas representativa, formal e injusta.

Os guerreiros  indígenas voltam à cena, ao espaço do poder, no planalto central.  Vem  exigir que não  retirem  seus direitos  da Constituição.  Senhores do  poder, cumpram a Constituição e não a rasguem, não desonrem o país,  não manchem a imagem da nação. Nossos direitos são sagrados e sob nenhuma hipótese podem ser violados.

O espartano grito de guerra e paz dos Kayapó e centenas de povos indígenas,  encheram o espaço do Centro de Formação Vicente Cañas, onde se reuniram mais de mil indígenas que, na madrugada do início de outubro, acamparam na esplanada dos ministérios para fazer ouvir o seu grito, nacional e mundialmente. A chuva fina não tirou o ânimo dos guerreiros que em pouco tempo construíram a grande aldeia plural no coração do poder, no planalto central.

Conquistas e retrocessos

Quando, há 25 anos, Ulisses Guimarães, presidente do Congresso Constituinte, declarava aprovada a nova Constituição, consagrava uma carta Magna, na qual, pela primeira vez os povos indígenas conquistaram importantes direitos sobre seus territórios e recursos naturais e na sua relação autônoma com relação ao Estado e a sociedade brasileira.

Porém  os povos indígenas não alimentavam ilusões quanto às enormes dificuldades que teriam pela frente, para fazer os direitos saírem do papel e se tornarem realidade. Não tinham dúvidas de que as elites políticas, econômicas e militares de tudo fariam para inviabilizar esses direitos. E assim aconteceu. Prova disto é que cinco anos após a aprovação da Constituição, quando todas as terras indígenas deveriam estar demarcadas, parlamentares e setores anti indígenas desencadearam uma intensa campanha de “revisão da Constituição. Na prática significada retirar direitos sociais dos índios, quilombolas e outros setores sociais. Apesar de não terem conseguido seus intentos em 1993, não desistiram de suas intenções retrógrados e genocidas.

Se não conseguiram retirar os direitos indígenas na Constituição,  conseguiram inviabilizar a efetivação desses direitos, na prática. As maior prova disso é que mais de 80% das terras indígenas, ou sequer foram demarcadas ou tem alguma forma de invasão. Além disso, o Estatuto dos Povos Indígenas, que seria fundamental para implementar e explicitar a efetivação dos direitos, até hoje não foi aprovado. O mesmo acontece com o Conselho Nacional de Política Indigenista, que poderia ser instrumento de superação da pratica colonialista  do Estado brasileiro com relação aos 305 povos indígenas no país, até hoje continua emperrado no Congresso.

A guerra secular continua. Mudam as garras, mas permanece o preconceito, os esbulho, ódio, o racismo o etnocídio e o genocídio. Até quando?
Os povos indígenas em   Brasília e em todo o país estão se mobilizando para defender seus direitos constitucionais, consuetudinários, originários e sagrados, a seus territórios e seus projetos de vida e autonomia.

 Protagonismo indígena

Após as grandes Assembleias Indígenas, da década de 70, as grandes mobilizações  da década de 80, a Marcha e Conferência Indígena de Coroa Vermelha, no ano 2000, os Acampamentos Terra Livre,  os povos indígenas no Brasil estão construindo um  importante protagonismo dentro do cenário de transformações sociais no país e no continente. E hoje somam forças aos quilombolas, professores, acadêmicos universitários e  numa sociedade civil, mais informada dos direitos destes povos.

Estão se mobilizando para impedir que se continue rasgando a Constituição, massacrando os povos originários, tripudiando sobre a legislação nacional e internacional que assegura os direitos e a diversidade étnica, cultural e societária no Brasil.

O  movimento indígena, nesses 25 anos avançou e consolidou um amplo e permanente espaço de luta e afirmação de seus projetos de vida e de futuro, construindo e ampliando as alianças com os demais setores oprimidos, explorados  e excluídos da sociedade. O movimento indígena tem construído seu protagonismo na resistência e nas lutas pelos seus direitos dentro dos amplos processos de transformações sociais e construção de novos modelos de Estado e sociedade, na pluralidade de povos e culturas, com justiça social e democracia participativa e comunitária.

Os povos indígenas estão em mobilização, na avenida Paulista, nos fechamentos de estradas, nas retomadas de seus territórios originários, nos espaços dos três poderes em Brasília.

Egon Heck

Povos Indígenas do Brasil em mobilização

Brasila, 2 de outubro de 2013

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