ATL 2017

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sábado, 31 de agosto de 2013

Retrocesso na mesa de negociação (Povos Indígenas do Mato Grosso do Sul )


Em sua quinta reunião, a mesa de negociação tão decantada pelo Ministro da Justiça, transformou-se numa mesa de decepção e retrocesso.

Os representantes do governo do Estado do Mato Grosso do Sul, foram logo deixando claro a mudança de posição com relação à Terra Indígena de Buriti. "Não existe mais terra a ser comprada com os Títulos da Dívida Agrária. Portanto  nada feito com relação aos 16 mil hectares que seriam comprados pelo governo federal e pagos pelo governo estadual".

 

"Isso mostra claramente que não existe interesse por parte do estado em resolver o problema." Uma das presentes, que não é membro da Comissão, teria logo acrescentando "temos que ir para o plano B". Ou seja, o único caso que parecia estar resolvido, retrocedeu e na próxima reunião, daqui há 15 dias, a assessoria jurídica terá que apresentar outra alternativa. Outros prazos e propostas postergarão indefinidamente qualquer solução efetiva. "Tudo voltou à estaca zero" afirmaram as lideranças participantes

Levantamentos feitos pelo juiz Odilon de Oliveira apontam mais de 300 mil hectares  de terra no Mato Grosso do sul em poder do narco-tráfico. Existem tamaabém terras públicas da União... O que na verdade precisaria ser feito é um levantamento fundiário das terras no Estado, que pudesse servir de base das terras disponíveis que poderiam ajudar as soluções para garantir as terras indígenas neste Estado

 Como há 513 anos

A maior surpresa da reunião foi a presença de três pessoas de uma mesma família trazendo consigo três lideranças Kaiowá Guarani. Ficou evidente que a velha estratégia de dividir o povo, para provocar conflitos internos, estratégia dos invasores há mais de cinco séculos, continua sendo utilizada.


O grupo responsável pelo levantamento de terras que poderiam ajudar a encontrar saídas juridicamente cabíveis, integrado pelo INCRA e governo do MS, simplesmente comunicou que não fez o levantamento pois não existem terras disponíveis no Estado.
 
Diante da manifesta falta de boa vontade do governo estadual, resta aos povos indígenas, suas comunidades e organizações encontrarem os melhores caminhos para terem seus direitos respeitados e as violências físicas,  culturais e psicológicas erradicadas.

"Foi muito frustrante. Cada vez que vou numa reunião dessas saio com dor de cabeça", desabafou um dos indígenas participantes.

 A dor em chamas

Enquanto isso o sofrimento, a violência e destruição continuam no chão manchado de sangue indígena, no Mato Grosso do Sul.

Mais uma vez a cacique Damiana e seu povo à beira da estrada, se veem envoltos  na dor da terra negada e agora novamente seus barracos queimados pela insana ganância da cana. A usina São Fernando arrenda as terras que envolvem o acampamento, para o plantio de cana. Mesmo as chamas não apagam a esperança da guerreira e sua gente, de um dia voltarem novamente parra seu tekohá-terra tradicional.

Esse provavelmente é o acampamento que mais tem sofrido em termos de mortes por atropelamento, queima de casas, expulsão por várias vezes nesses mais de quinze anos na beira da estrada.

O diretor da Survival Stephen Corry disse hoje, ‘Os povos indígenas do Brasil são constantemente sacrificados em nome da ganância, suas vidas perdidas na busca do crescimento econômico a qualquer custo humano. Os Guarani têm o direito de voltar às suas terras, mas em vez disso, são forçados a sofrer uma vida de imundície na beira da estrada.’(Cimi-27/08/13)




Egon Heck

Povo Guarani Grande Povo

Cimi Brasília 29 de agosto de 2013

 

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O Estado das "Mesas"


O Ministro da justiça manifestou a sua convicção de que agora o governo encontrou o caminho da roça, do diálogo. São as mesas. Amplas e irrestritas, na medida do possível. Mesas de negociação. E quando uma liderança Pataxó interveio dizendo "Direitos não se negocia. Cumpra-se a lei. O ministro teve que aliviar. "É, mas o direito no papel é uma coisa e na prática a realidade é outra"


Todos sabemos disso. Os povos indígenas nunca se negaram ao diálogo afinal isso é uma pratica milenar nas comunidades, mas sempre diálogos de soluções nuca diálogos de enrolações .

A PEC e as pegadas

Finalmente. Conforme prometido várias vezes, o governo começa a se manifestar publicamente contra a avalanche de  projetos de lei e emendas constitucionais que rondam no Congresso, tentando subtrair direitos indígenas da Constituição.

As afirmações do Ministro da Justiça revelam  "O governo é contra essa proposta(PEC 215). Juridicamente e no mérito. É inconstitucional e fere o princípio da separação dos poderes. Disse ao Henrique Eduardo Alves: sou contra, isso vai aumentar a pressão, vai transformar a demarcação em disputa política. Vocês estão errando. Estão radicalizando e jogando fogo. E perdendo a oportunidade de  resolver pacificamente. Se é que querem resolver pacificamente — disse Cardozo, que não garantiu a rejeição dessa PEC no Congresso" (O Globo, 22/08/2013).

Mais senhor ministro. O governo tem que ser contra a portaria 303 que é contra a Convenção 169, da OIT e a Constituição do país,  a PLP 227 que é inconstitucional e contra as normas internacionais (OIT,ONU...) E principalmente se posicionar contra a instalação da Comissão da PEC 215, anunciada pelo presidente da Câmara para dia 4 de setembro.

Essa semana o governo inaugurou mais uma mesa. A mesa da Dilma.Ou melhor, sugerida pela Presidente, por ocasião de seu primeiro encontro oficial com os povos indígenas, depois de dois anos e meio de governo. Será que o governo está mesmo disposto a descolonizar sua visão e prática  com relação aos povos indígenas? Será que o Estado brasileiro está disposto a fazer uma inflexão em sua política indigenista, tão marcada pelo preconceito e repressão, heranças da ditadura militar? ou será que esta ganhando tempo tentando agradar a todos até as eleições?

É tempo de despir-se da colonialidade, como em vários países da América latina está acontecendo! Reconhecer a plurinacionalidade dos países, colocar  o Bem Viver como escopo do Estado, reconhecer os direitos da Natureza, da Pacha Mama-Mãe Terra, é colocar-se no caminho do futuro e não o caminho do mercado e dos privilégios de minorias.

A mesa do Henrique Alves, presidente do Congresso já acabou. Quando os índios , em abril, adentraram no plenário da Câmara, provocaram uma situação de pânico e correria,  ganharam uma mesa, um espaço de diálogo, uma comissão de conversação. Umas poucas reuniões e a mesa acabou. Agora é só após outro episódio.

Outras mesas, comissões e fóruns estão encerrando suas atividades, sem  sinalização de vontade política das mudanças exigidas. A Comissão do Conselho Nacional de Justiça já entregou seu relatório ao presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa. Em 127. Em 127 páginas de informações, debates, fotos, mapas, listagens de terras indígenas no Mato Grosso do Sul, e sua situação na justiça e no executivo, é sem dúvida um início  que exige decisão e ação dos responsáveis pela regularização das terras indígenas e da solução dos conflitos e violências que marcam esse processo.

A comissão exorta a União  "a conclusão definitiva do processo administrativo demarcatório  com indenização das benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa fé." Sugere ainda saídas já anuncias à exaustão como " desapropriação de áreas por interesse social, aquisição direta de terras, o assentamento de pequenos proprietários rurais, a transação judicial e a indenização do produtor rural por ato ilícito do Estado decorrente da titulação considerada  posteriormente ilegítima". 

Dentre outras medidas faz um apelo "aos juízes de todo o país para a adoção de absoluta prioridade aos processos judiciais envolvendo a demarcação das terras indígenas".

A Comissão Especial Guarani, criada no âmbito da Secretaria de Direito Humanos, também deliberou pela visita da Ministra Maria do Rosário ao presidente do STF Joaquim Barbosa para solicitar urgência no julgamento das ações relacionadas aos direitos indígenas

Assembleia da COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira)

Está começando hoje, na aldeia Umutina, no município de Barra do Bugre-MT, a 10 Assembleia Geral da COIAB, num momento histórico da luta dos povos indígenas contra a supressão de seus direitos na Constituição. Em pauta, além das questões nacionais, a reestruturação da organização e eleição da nova coordenação. Enquanto organização aglutinadora dos povos e do movimento indígena na Amazônia, essa articulação das lutas em nível regional e nacional é fundamental. Daí a importância dessa Assembleia.

 

Egon Heck

Povos da Amazônia, Povos guerreiros

Cimi Brasília, 26 de agosto de 2013

 

sábado, 17 de agosto de 2013

Porque correm tanto, senhores Ministros!


 

Tem centenas de filhos de hansenianos me esperando. Eles também merecem atenção. Preciso ir.Tem uma delegação de ruralistas me esperando. Eles querem conversar. Precisamos dialogar com todos. Preciso ir, pois tem um grupo de trabalho que está buscando aperfeiçoar o processo de demarcação das terras indígenas. Preciso estar lá. Tem agricultores do Paraná que querem conversar sobre a demarcação de terras indígenas. Preciso ir. Cheguei um pouco tarde, estava em outra agenda, mas vim aqui  pois não poderia deixar de estar com vocês. A palavra de ordem é dialogar, evitar conflitos, superar tensões, nada de desgastes . " E na nada de soluções!"

Mas ministros, vamos ao menos tirar uma foto juntos, insistiram alguns indígenas! Concordaram, mas cada um saiu correndo para um canto. Como por encanto, sumiram.

O que a delegação de 16 povos indígenas sentiram, na audiência no Palácio do Planalto, com os quatro  Ministros - da Justiça, Casa Civil, AGU e Secretaria Geral da Presidência da República, é que os Ministros tem pressa. Tem que dar o recado, mostrar que existe unidade no pensamento e ação do governo, deixar claro que o governo não está contra os índios, mostrar os grandes feitos, deixar todos satisfeitos, aparentemente e sumir.  As palavras de ordem dos ministros é negociar, dialogar, evitar judicialização e conflitos, governar para todos.
O ministro da Justiça afirmou que agora parece ter sido encontrado o caminho da solução, a mesa de negociação. Já está implantada no Mato Grosso do Sul. Logo mais será instalada no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. E se dirigindo diretamente aos caciques dos 16 povos indagou: porque não seguir o mesmo caminho na Bahia? Vocês topam? Se quiserem ligo imediatamente para o governador Jaques Wagner e marcamos logo o encontro para instalar a Mesa de Negociação na Bahia. Os indígenas surpresos com a apressada proposta do governo, não se manifestaram a respeito. Iriam consultar os demais participantes e as comunidades. Porém como o ministro da justiça não mostrou nenhuma vontade de assinar as portarias das terras indígenas da Bahia, que estão em sua mesa, numa avaliação posterior, REPUDIARAM a criação dessa mesa de diálogo. "Direito não se negocia. Se houver boa vontade e boa fé por parte do governo, cumpra seu dever constitucional, assine as portarias, e depois sentaremos `a mesa para dialogar".

A Ministra Gleisi Hofmman se esmerou em  afirmar  que não é verdade que o governo é contra os índios, ou que existam posições contraditórias dentro do próprio governo sobre os direitos indígenas. "Temos que ouvir todas as partes, somos governo de todos! Será?

Resultados, decepções e indignação.

Semana da Bahia nativa em Brasília. Os 150 indígenas de 16 povos que vieram da região do início da invasão, cobrar seus direitos e manifestar sua indignação com a conduta do Estado brasileiro com relação a seus direitos,  deixaram Brasília, essa madrugada, cansados , mas com a certeza do recado dado. Foi uma semana intensiva de informação e formação política, no coração do poder. Fizeram muito toré, invocaram os encantados, os seres de luz, Tupã, na esperança de arrancar algumas posições favoráveis  às suas inumeráveis reivindicações de direitos. Participaram e falaram em duas audiências publicas, tiveram encontros em vários ministérios e órgãos,  fizeram várias manifestações nas praças e dentro dos espaços das atividades.

Entregaram cartas, documentos, fizeram falas duras, deram voz à indignação e revolta. "A invasão que começou em nossa região há mais de 500 anos, continua hoje. Porque o governo não cumpre a lei que fizeram?, indagaram várias vezes diante dos presidentes da Funai, do Incra, do ICMBio, da Sesai, da secretaria Geral da presidência da República.




Muitas desculpas e promessas esfarrapadas ,  tergiversações, e afirmações desalmadas.  Diante das pressões e cobranças, parece que o governo se entrincheirou no vazio da negociação,  no diálogo para evitar o conflito,  no ganhar tempo e evitar desgaste num aberto jogo de interesses eleitorais.

Os  melhores resultados ficaram por conta de uma semana de visibilização da causa e luta dos povos indígenas, no Brasil, e de forma especial, na Bahia, onde a invasão começou. Tupã ,os encantados e os iluminados  minoraram os sofrimentos de horas e horas em um transito caótico, ou transitando nos espaços do poder.

Homenagem, solidariedade e saudade

Irmã  Lucinda Moretti (71) , que trabalhava com as comunidades indígenas Kaiowá Guarani, nos deixou repentinamente  dia 16, quando sofreu um grave acidente com o carro em que retornavam para a cidade de Juti. Lutadora incansável, marcava também presença solidária junto a acampamentos dos sem terra.  Nossa solidariedade aos seus familiares à Congregação das Irmãs de São José, ao Cimi MS e aos familiares e amigos de nossa inesquecível guerreira Ir. Lucinda.

Nosso apoio solidário também aos tupinambá da Bahia que nesses dias retornaram a vários espaços tradicionais, de seu território, estando a sofrer pressões e ameaças.

Egon Heck e Laila Menezes

Povo Guarani Grande Povo e povos da Bahia, os primeiros invadidos,

Cimi Brasília, 17 de agosto de 2013

domingo, 11 de agosto de 2013

Kaiowá Guarani -Manchas de Vergonha


 

A Anistia Internacional vem acompanhando com preocupação a realidade dos povos indígenas no Brasil e particularmente no Mato Grosso do Sul. Foi no intuito de ver e sentir a atual situação desses povos que uma delegação coordenada por Salil Shetty. Estiveram no acampamento da Teko'á wirixa (Xamã) Damiana, próximo a Dourados, na beira da BR 463. 

Uma "mancha de vergonha", conforme expressou o representante da Anistia. Ali onde a cana e a soja se encontram, onde casebres Kaiowá Guarani estão espremidos entre a cerca e o asfalto, talvez seja a mais contundente imagem da discriminação,   racismo e genocídio em curso contra comunidades desse povo.

A alta velocidade com que os veículos passam no local, sem nenhuma sinalização, fazendo frequentes vítimas, manchando de sangue asfalto e terra, é mais um trágico símbolo da violência estrutural ali implantada. Somente neste acampamento ocorrem a morte de 5 pessoas da mesma família, por atropelamento.

A delegação acompanhada de várias lideranças indígenas da região e aliados, foi também, em silenciosa indignação, prestar sua homenagem às vítimas, especialmente crianças, mortas nos últimos anos, sem que até hoje nada tenha sido feito para punir responsáveis ou evitar a continuidade da tragédia. As cruzes na beira de um riacho, num resto de mata, tem que ser colocadas e visitadas à escondida, pois os donos do agronegócio na região querem impedir a todo custo o sepultamento das vítimas neste  local. E narra a Xamã Damiana que viu o corpo de sua tia, ser arrancado por uma escavadeira a mando dos mesmo.

Não é apenas mais uma delegação a constatar a violência, contra os direitos humanos e étnicos de uma comunidade Kaiowá Guarani, é mais um grito de alerta internacional contra as "manchas de vergonha" espalhadas  pelo Mato Grosso do Sul.

Dia Mundial dos Povos Indígenas

Por ocasião do dia mundial dos povos indígenas instituído pela ONU em dezembro de 1994, houve inúmeras manifestações, denúncias e protestos pelo mundo afora.

A Coordenação Andina dos Povos Indígenas  (CAOI) divulgou uma carta na qual chamam atenção dos Estados nacionais e sociedade sobre o continuado desrespeito dos direitos dos povos indígenas, apesar de serem signatários de várias leis, normas e convenções que garantem o direito desses povos especialmente a seus território e recursos naturais, liberdade e paz.

Concluem se pronunciando "contra a perseguição judicial e todas as demais formas de criminalização do movimento indígena de Abya Yala como estratégia de intimidação aos líderes indígenas  e contra a liberdade de expressão e direito de protestar que os povos originários temos tido como única estratégia de visibilizarão de nossos direitos".

 Em Roraima em torno de 500 indígenas marcharam pelas ruas da capital Boa Vista,

protestando contra a violação de seus direitos, entregando documento em várias repartições públicas. No documento denunciam as diversas ações em curso  contra os direitos indígenas nos três poderes. Concluem conclamando "O  Estado de Roraima deve aprender e trabalhar com a realidade local e adequar o plano de desenvolvimento a partir dos direitos indígenas. Com nossa Marcha no dia  Internacional dos Povos Indígenas, chamamos atenção das nossas autoridades públicas para a grave situação dos direitos dos povos indígenas em Roraima para reverter esse quadro negativo, pela Justiça e Dignidade."

Mesa de diálogo ou de enrolação

Frustração. Esse foi novamente o sentimento entre os mais de 40 mil Kaiowa e Guarani no Mato Grosso do Sul. O governo, através de seus ministros havia prometido uma solução definitiva para a grave situação das terras indígenas desse povo e dos Terena. A reunião  que deveria definir a proposta foi protelada do dia 5 para o dia 7, sem qualquer proposta concreta de solução, além de uma saída de duvidosa execução, para a Terra Indígena Buriti, onde foi assassinado pela polícia a liderança Terena Oziel.

Os Kaiowá Guarani honraram sua palavra e não retornaram a nenhum território tradicional, originário, neste período. Já o governo, através da "mesa de diálogo" apenas gerou mais uma profunda decepção e total descrédito quanto às soluções infinitamente adiadas.

Com nosso grande profeta e poeta D. Pedro nos colocamos na sintonia da esperarnça e tranformação

Oração da causa indígena

Pai-Mãe da Terra e da Vida,
Deus Tupã de nossos pais e mães,
Venerado nas selvas e nos rios,
No silêncio da lua e no grito do sol:

Pelos altares e pelas vidas destruídas

Em teu nome, profanado,

Nesta nossa Abia Yala colonizada,

Te pedimos que fortaleças

A luta e a esperança dos povos indígenas

Na reconquista de suas terras,

Na vivência da prória cultura,

Na fruição da autonomia livre.

E dá-nos (a nós neocolonizaores)

Vergonha na cara e o amor no coração

Para respeitarmaos esses povos-raiz

E para comungar com eles em plural Eucaristia

Awere, Amém, Aleluia

(Dom Pedro Casaldáliga)

Pelos altares e pelas vidas destruídas
Em teu nome, profanado,
Nesta nossa Abia Yala colonizada,
Te pedimos que fortaleças
A luta e a esperança dos povos indígenas
Na reconquista de suas terras,
Na vivência da própria cultura,
Na fruição da autonomia livre.
E dá-nos (a nós, neocolonizadores)
Vergonha na cara e amor no coração
Para respeitarmos esses povos-raiz
E para comungar com eles em plural Eucaristia.
Awere, Amém, Aleluia!







                        Egon Heck

                        Povo Guarani Grande Povo

                        Cimi, Brasília, 11 de agosto de 2013


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

A força e revolta dos filhos da Terra Vermelha









Termina mais uma Grande Assembleia (Aty  Guasu).  Inverno rigoroso, com geada e vento cortante. Nada melhor que um fogo aconchegante e um bom chimarrão. Nada fez as centenas de lideranças, caciques , nhanderu e nhandesi(Tekoa'ruvixa),  desistir da realização mais um grande momento de reza, de fortalecer a esperança e reafirmar a decisão da dura luta pelos tekohá, terras originárias, tradicionais.

Dourados, cidade e aldeia. É incrível que mundos tão diferentes coexistam há  tantas décadas. Os Guarani Kaiowá com sua cultura e religiosidade inquebrantáveis,  conseguem fazer mundos com valores e formas de vida tão diversos,  sobreviverem.  Isso só é possível graças à força cultural e profunda religiosidade desse povo, aliados a eficazes estratégias de resistência. Da fecunda terra vermelha brotam seus heroicos filhos, que nela lutam, gritam e pedem socorro, pois  querem viver com dignidade e em paz em suas terras tradicionais, sagradas, em seus tekoha. Por isso não se cansaram de agitar sua principal palavra de ordem "terra, vida, justiça e demarcação"

Muita reza e ritual. Batizado de mais de uma dezena de crianças e aliados

Como em todas as Grandes Assembleias Kaiowá Guarani(Aty Guasu), a dimensão ritual religiosa  é fundamental.  Os rezadores(as), voltam a ter uma função de centralidade nas comunidades e no movimento. Voltam a ser reconhecidos como "Tekoa'ruvixá" aqueles que
dão vida às crianças. 

No documento dos rezadores, deixam claro suas angustias, sofrimento e esperanças
" Nós estamos preocupados em não ver acontecer o nosso sonho de ao menos morrer em nosso tekoha terra tradicional. Queremos entrar na nossa terra e morrer nela. Nosso sonho é esse e não dá mais pra esperar.

Para toda essa cultura continuar viva nós precisamos da terra. Essa cultura funciona com a terra. Não temos como viver assim na beira de uma estrada nem num canto de uma fazenda. Enquanto não tiver a terra, não tem como viver.

A terra é a sobrevivência da nossa cultura, da nossa nação. Essas são as principais coisas. Isso não interessa para os brancos. Para os brancos isso não é nada. Os Tekoa’ruvixa mais velhos estão envelhecendo e morrendo e queriam que já tivessem voltado tudo no tekoha. Querem entrar na terra, ainda vivo, para morrer no tekoha deles, onde morreram os nossos avôs. Não dá mais para esperar.

Fim da impunidade , memória das vítimas

Um dos momentos fortes foi o da solidariedade a todos os guerreiros(as) que morreram na luta pela terra e os direitos dos Kaiowá Guarani e Terena. Essa memória foi também um grito de basta de assassinatos e de impunidade. Po isso nos documentos deixaram claro:

 "Exigimos justiça nas dezenas de casos de assassinatos de lideranças, professores e jovens indígenas no contexto dos conflitos e da falta de terra. Nenhum dos assassinos dos Guarani e Kaiowá está preso e suas famílias estão desassistidas. Exigimos punição aos culpados e respeito às comunidades atacadas!

Chega de perseguição contra movimentos e entidades apoiadoras do movimento indígena. Somos autônomos e independentes, e estabelecemos nossas próprias relações políticas como bem entendermos e isso não é crime."

Recado jovem

Enquanto uma comitiva de Terena e Kaiowá Guarani, estavam no Rio de Janeiro , no Encontro Mundial da Juventude, grande número de jovens participou ativamente da Aty Guasu,  redigindo uma carta na qual expõem suas exigências:" nós jovens estamos vendo o sofrimento na questão da luta de nosso tekoha. Precisamos urgente que demarquem as nossas terras tradicionais. Nós somos o futuro e a raiz da terra.

Queremos nossas terras de volta. Estamos na luta pelo nosso direito. Passamos precários problemas e obstáculos por causa das nossas terras. Nos preocupa as nossas lideranças que já foram várias vezes ameaçadas, e continuam sendo ameaçadas por estarem lutando pelo que é nosso."

Depois do dia 5, outra história

A questão central foi novamente a falta de providências na demarcação e devolução de seus territórios tradicionais.  Não aguentam mais. Em coerência à luta e exigência de soluções urgentes e definitivas, estão cumprindo o prazo estabelecido na meda de negociações, dia 5 de agosto. Se até então nenhuma solução for implementada, eles tem seus planos determinados para a questão da terra:
" Cumprimento, até o dia 5 de agosto, da promessa do governo federal de resolver o problema da demarcação de todas as terras indígenas de todos os povos do Mato Grosso do Sul. Nós estamos respeitando o acordo com o governo e aguardando alguma solução, e até agora o governo não fez nada. Nós não aceitaremos outro prazo. De norte a sul do país, nós indígenas estamos juntos na luta contra a perda de direitos, contra a perda de nossas terras, e pela demarcação de nossos territórios tradicionais. (Documento da Aty Guasu)

Houve vários depoimentos contundentes, relatando que o sofrimento é o mesmo, e que muitas vezes estão chegando à beira da desesperança "Estamos assinando a homologação com o nosso sangue.
Da parte da Funai, apesar do apoio, foi cobrado, principalmente agilização da demarcação das terras. A presidente do órgão, Maria Augusta, reconheceu que a Funai erra e muito, mas está aí presente ouvindo os clamores e exigências dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul. "Vou sair daqui com o coração preocupado,  disse ela. Porém ressaltou que não vai prometer coisas que não vai poder fazer por não depender da Funai. Depende da Justiça e da pressão de muitos inimigos dos vossos direitos.

No decorrer dos falas, muitas denúncias foram feitas, especialmente de violências, ameaças e desmatamento da pouca mata que ainda existe nas terras já demarcadas.

Todos se declararam em estado de alerta e total disposição de retornar às suas terras tradicionais, caso não houver solução até o dia 5 de agosto, conforme prometeu o ministro Gilberto Carvalho.

Egon Heck
Povo Guarani Grande Povo
Cimi Brasília, 31 de julho de 2013




Aty Guasu, Marçal e o Papa







“Santidade...estão matado nosso povo...fomos uma grande nação, hoje estamos jogados à beira das estradas, das cidades e da memória dessa região e pais. Mas não somente estamos vivos  e resistentes, como decididos a continuar lutando pelos nossos direitos, pelas nossas terras sagradas, que estão sendo destruídas e nossas águas e fontes envenenadas pelo que chamam de progresso, desenvolvimento. Nós queremos e exigimos muito pouco Santidade...apenas queremos viver com dignidade e paz encima de nossas terras e territórios . Muitos dos que nos combatem, negam nosso direito à terra e assassinam nossas lideranças se dizem católicos, seguidores  vosso e do Deus da vida. Diga a eles e a todas as pessoas do mundo que o admiram e seguem que o nosso Deus, Nhanderu, é o mesmo Deus da paz, da verdade, da justiça e da vida...”

E o Papa, emocionado diante daquela esquálida e determinada criatura, externou  o compromisso pelos direitos das nações indígenas no Brasil
Trinta anos se passaram, daquela noite quente em Manaus, quando o João Paulo II teve um encontro com os povos indígenas.

Nesta manhã  gelada, de geada em Dourados, bem próximo à casa em que Marçal viveu parte de sua vida, na aldeia Jaguapiru, centenas de lideranças Guarani Kaiowá estão reunidas em mais uma grande Assembleia. Como no início da década de 80 as maiores violações de direitos e atrocidades contra os  povos indígenas aconteciam na Amazônia, com a implantação dos grandes projetos, principalmente as grandes estradas da invasão dos territórios indígenas e extermínio de comunidades e povos, hoje um encontro do  Papa Francisco com os povos indígenas certamente aconteceria ali onde os índios estão sofrendo as maiores violências, no Mato Grosso do Sul.  Ali seria reverenciada a memória de Marçal, que foi assassinado em novembro de 1983,  e os inúmeros mártires da luta pela terra e vida do povo Kaiowá Guarani, Terenas e demais povos indígenas no Brasil.

Tres  jovens Guarani estarão próximos ao Papa numa celebração eucarística nesses dias. Quem sabe consigam fazer chegar o grito pela vida, terra e justiça, ao papa Francisco.

Enquanto isso

Aconteceu em Campo Grande mais uma reunião do grupo especial criado para encontrar solução para a gravíssima realidade das terras indígenas no Mato Grosso do Sul. Pouco, ou quase nada se avançou na perspectiva de um inicio de solução. Ao contrário chegou a ser ventilada a insana proposta de se arrendar terra para os indígenas no Estado. Absurdo do absurdo.Seria a União arrendar terras que constitucionalmente são suas, por serem   tradicionalmente indígenas, para  assenta-los

Na ogasu (casa de reza grande) Nhanderu Getulio coordenou o dia da voz, palavra e reza, dos Nhanderu e Nhandesi Kaiowá Guarani. Hoje a grande Assembleia  estará discutindo e definido estratégias com relação à questão das terras.
“Mesmo matando nosso sonho, jamais desistiremos de lutar pela nossa terra” – Conselho da Aty Guasu

Egon Heck
Povo Guarani Grande Povo
Dourados, 25 de julho de 2013